OBSERVATÓRIO DE DIREITOS HUMANOS

 

Três a cada dez mulheres já fizeram aborto no Brasil. O que essa frase te faz pensar?

O aborto e a luta pelos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres são pautas do movimento feminista há décadas. Em 1994, foram reconhecidos como direitos humanos pelos países signatários da Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento da ONU (como o Brasil) firmando o compromisso de tratar o aborto como questão de saúde pública e de revisar leis que o criminalizam. No Brasil, o aborto é permitido quando há risco de morte materna, anencefalia ou violência sexual. No Rio Grande do Sul, o número de hospitais que o realizam (7) contrasta com os dados de estupro no Brasil: 1 a cada 8 minutos. 85% das vítimas são mulheres e meninas; poucas conseguem abortar de forma legal e segura. A desigualdade de gênero está na raiz desta violência.

Enquanto o debate pela descriminalização avança mundialmente, o direito à liberdade reprodutiva está sob ataque no Brasil, por investidas governamentais que dificultam o acesso ao aborto legal e reforçam a criminalização irrestrita. Vemos isto na assinatura do “Consenso de Genebra” (uma declaração contra o aborto e em defesa da família tradicional), nas portarias 2282/2020 e 2561/2020 do Ministério da Saúde (que cerceiam psicólogas/os e demais profissionais dos serviços de aborto legal ao obrigar a quebra de sigilo e o registro policial para realizar a interrupção de uma gravidez decorrente de estupro, ferindo o exercício profissional regido por nosso Código de Ética) e também no Decreto 10531/2020 (que direciona o funcionamento do Estado e orienta que as legislações devem 'promover o direito à vida desde a concepção'), comprovando que a pauta "moral" é parte essencial do projeto político em curso. Lembremo-nos que recentemente uma criança, ao tentar exercer seu direito após estupro, foi exposta a um debate que ilustrou a deslegitimação da laicidade do Estado e dos direitos humanos das mulheres por discursos morais e de ódio. 

 As mulheres que abortam são de todas as classes sociais, grupos raciais, níveis educacionais e religiões. Porém, os marcadores sociais escancaram: a mortalidade é maior entre mulheres negras e indígenas, de baixa escolaridade, com menos de 14 e mais de 40 anos, no Norte, Nordeste e Centro-Oeste do país. Então, a que(m) serve a criminalização do aborto?

Comissão de Direitos Humanos do CRPRS