REPORTAGEM ESPECIAL - PARTE 1
50 anos do CRPRS: reunindo memórias para reconstruir a história
Em 2024, o Conselho Regional de Psicologia do Rio Grande do Sul (CRPRS) comemorou 50 anos de sua fundação. Inicialmente, com abrangência nos estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná, as primeiras gestões do Conselho Regional de Psicologia da 7ª Região reuniam representantes dos três estados. No ano de 1979, foi constituído o CRP da 8ª Região (CRP PR) e em 1992, publicada a Resolução que instituiu o CRP da 12ª Região (CRP SC).
Para marcar seu cinquentenário, o CRPRS lançou o projeto Memória, que tem como objetivo resgatar a história do Conselho e, consequentemente, da Psicologia no Rio Grande do Sul. Durante os meses de outubro e novembro de 2024, foram contatadas/os conselheiras/os representantes* dos 16 plenários que antecederam a atual gestão, com o objetivo de recontar essa história e refletir sobre os contextos social, político e econômico de cada década e seus atravessamentos na profissão. "A preocupação com a história e com a memória nos levou a essa iniciativa. Buscamos dar visibilidade àquilo que gestões anteriores fizeram para que, hoje, estejamos neste patamar de reconhecimento nacional no Sistema Conselhos de Psicologia, com importância técnica e política", afirma a conselheira presidenta do CRPRS, Míriam Cristiane Alves (CRP 07/24471).

Nesta reportagem especial, revisitamos esses 50 anos do CRPRS a partir de memórias. A ideia é colocar em perspectiva não somente os fatos históricos e as consolidações políticas realizadas pelas Gestões, mas fatos que marcaram pessoalmente cada uma/um das/os entrevistadas/os. “O que nos interessa é a construção de uma retrospectiva afetiva, cujos fios de conta compõem as memórias do CRPRS”, como define o conselheiro Ademiel de Sant’Anna Junior.
Ao longo desses 50 anos, já passaram pelo CRPRS 17 plenários e 392 conselheiras/os: pessoas que contribuíram, em diferentes momentos sociais e políticos, com a valorização e a defesa da Psicologia, marcada sempre pelo seu compromisso social, técnico e ético. Qual era o contexto histórico, político ou social do Brasil ou do Rio Grande do Sul na época? Que pautas estavam em evidência para a Psicologia durante a gestão? Qual foi a grande marca de cada gestão, ou seja, as principais contribuições deixadas para o CRPRS ou para o Sistema Conselhos? Essas foram algumas das questões abordadas durante as entrevistas conduzidas pela atual presidenta do CRPRS. As pautas em evidência em nossa sociedade vão marcando as gestões em seus tempos, marcando o compromisso social da Psicologia.
Defender o lugar da Psicologia, o direito ao exercício profissional, a inserção da profissão nas políticas públicas conforme elas vão sendo constituídas e o compromisso com os direitos humanos e suas diferentes lutas marcam os 50 anos do Conselho. Além disso, a profissão foi crescendo e exigindo a ampliação da estrutura física e funcional do CRPRS e a qualificação das equipes de trabalho. Atualmente, são quase 40 mil psicólogas/os ativas/os no Rio Grande do Sul.
“Hoje temos um Conselho que é permeado pelas diferenças, composto pela pluriversidade de existências e pelas múltiplas possibilidades de existir. Manter isso é o nosso grande desafio da contemporaneidade. Se antes a luta pelos direitos humanos, por exemplo, estava muito pautada na luta antimanicomial atrelada à saúde mental, hoje precisamos racializar e interseccionalizar essa discussão. Que pessoas são essas privadas de liberdade? Que corpos excluídos são esses? Pensar direitos humanos é pensar várias dimensões que vão constituir e garantir a dignidade humana para todas as pessoas”, afirma Míriam.
* O CRPRS fez contato com representantes do I Plenário do CRPRS (1974 – 1977) mas não conseguiu viabilizar a participação nessa reportagem.

Míriam Cristiane Alves | CRP 07/24471
XVII Plenário | Frente em Defesa da Psicologia RS | 2022 – 2025
Para não esquecer jamais

Os primeiros anos foram de construção da infraestrutura física, pessoal e operacional. A criação do Conselho Regional de Psicologia e a posse da primeira gestão, em sessão solene na Assembleia Legislativa do Estado, em 27 de agosto de 1974, estavam inseridas em um contexto de ditadura.
Silvia Brandão Skowronsky (CRP 07/00131), psicóloga da quinta turma do curso de Psicologia da PUCRS e que compôs o terceiro plenário do CRPRS (1980-1983), lembra desse período durante sua formação. “Quando entrei na faculdade, foi um choque. Havia um elevador grande para subir até o andar do curso, no qual colocaram uma barreira, permitindo a entrada de somente quatro pessoas por vez. Era um clima intimidador para a espontaneidade aparecer, e isso me incomodava bastante. Eu sempre fui de dizer o que pensava.”
O mesmo sentimento também era compartilhado por Marlene Neves Strey (CRP 07/00985), conselheira do quarto plenário (1983-1986). “Nós tínhamos olheiros do Departamento de Ordem Política e Social (DOPS) lá dentro, como colegas em sala de aula na faculdade. Então, era um clima tenso, de desconfiança e, principalmente, de medo.”
Esse clima opressor instaurado com a ditadura também estava presente nas primeiras gestões no CRPRS. “No início do quarto plenário, ainda estávamos vivendo um momento muito conturbado, sofrendo os efeitos da ditadura, lambendo suas feridas, todo mundo querendo, de alguma maneira, esquecer o passado, algo que não era possível ainda. Além disso, refletíamos sobre a relação entre a Psicologia e sua contribuição com o período da ditadura: o que era feito pelas/os psicólogas/os para manter e, naquela época, para libertar, para transformar e para fazer com que houvesse um clima mais saudável”, acredita Marlene.
Foto: Imagem de integrantes do Primeiro Plenário do CRPRS (1974 – 1977)
Movimento pró-Constituinte em defesa da democracia

O segundo plenário do CRPRS (1979-1980) assume com o objetivo de iniciar um processo de democratização: “Pegamos um Conselho que tinha sido constituído pelo regime militar e conseguimos democratizá-lo, mas sem grandes rupturas, pois convivíamos com a gestão anterior e precisávamos aprender com eles também”, lembra Nedio Seminotti.
E esse novo grupo não teve medo de ir às ruas para defender o próprio exercício profissional, especialmente diante de movimentos da Medicina para limitar ou restringir a atuação de outras profissões da saúde. Em 1979, psicólogas/os do Rio Grande do Sul lideraram um movimento político contra o Projeto de Lei Julianelli – medida que dava aos médicos exclusividade em áreas da saúde. Partiu do CRPRS a articulação dos demais Conselhos Profissionais de profissões ligadas à área, na qual foram feitos contatos com políticos para que o projeto fosse abortado. "Éramos jovens e, pela primeira vez, tínhamos uma instituição que podia nos dar algum poder de mobilização. Fizemos um movimento nas ruas muito bonito, caminhávamos ombreados, de braços dados na Rua da Praia, defendendo a Psicologia, e conseguimos evitar que esse Projeto fosse aprovado".
Nedio resgata a iniciativa pioneira de sua gestão em convocar a categoria para discutir sobre o orçamento da Autarquia. “Fomos para o que era, na época, a sede da Faculdade de Psicologia da UFRGS e colocamos em discussão o Conselho. Queríamos saber como devíamos usar o dinheiro”. O caráter democrático e participativo também foi ampliado para a indicação de psicólogas/os do estado que iriam compor a gestão seguinte do Conselho Federal de Psicologia. “Fizemos uma eleição e eu fui o candidato da situação e Cláudio Hutz, da UFRGS, o de oposição. Venci por uma diferença muito pequena.”

Tempos depois, Nedio – que seguia no Sistema Conselhos de Psicologia pelo Conselho Federal de Psicologia (CFP) – participou do processo constituinte, ou seja, de encontros que objetivavam a criação de propostas para a Constituição Federal de 1988.
“Era um movimento gaúcho pró-constituinte e nós, do Conselho, liderávamos isso. Um movimento bonito, de muita esperança na defesa de um governo democrático. Eu trabalhava com psicodrama e reuníamos grupos que simulavam um Congresso Constituinte para que as pessoas apresentassem projetos, ideias que deveriam constar na Constituição. Repetimos isso com vários grupos, não só no Rio Grande do Sul, mas em todo o país, enquanto CFP. Em Porto Alegre, merece ser destacado, fizemos esse trabalho com o Centro dos Professores do Estado do Rio Grande do Sul (CPERS) e na Feira do Livro. Estávamos empolgadíssimos com isso, principalmente para fazer constar nos programas de saúde pública aquilo que julgávamos importante para a Psicologia e para a saúde como um todo. Aí veio minha grande decepção: na posse do que seria o Ministro da Saúde, sequer mencionaram a Psicologia. Com isso, encerrei minha participação política na profissão.”
A participação do CRPRS no processo constituinte também foi citada por Marlene Neves Strey. “Qual era a contribuição que a Psicologia poderia dar, tendo em vista a Constituição que ia ser elaborada? Esse debate tirou a Psicologia de um lugar que olhava de cima para o resto da sociedade e colocou a Psicologia lá dentro, para sentir, contribuir e discutir sua contribuição para a formação de cidadãos e cidadãs.”
Foto 1: Recorte de jornal que mostra a mobilização do CRP contra o Projeto de Lei Julianelli
Foto 2: Boletim Informativo CRPRS com a seguinte chamada "O Psicólogo e a Constituinte - As propostas dos psicólogos para a Constituinte"

Nedio Antonio Seminotti | CRP 07/00529
II Plenário | 1977 – 1980
II Plenário | 1977 – 1980
Em busca do reconhecimento na Clínica

O início dos anos 1980 foi marcado pela conquista do espaço da Psicologia na Clínica. “Nós tínhamos, na época, três grandes áreas de atuação: Escolar, Trabalho e Clínica. Movimentos relacionados ao Ato Médico defendiam que toda a parte clínica do trabalho da/o psicóloga/o fosse supervisionada e vinculada à Medicina, como se a Psicologia não tivesse uma autonomia de práxis própria da Clínica. A atuação nessa área não era comum às/aos psicólogas/os, como se a profissão não habilitasse a isso”, resgata Silvia Brandão Skowronsky.
Com poucos profissionais na Psicologia, Silvia relembra a busca pelo sentimento de pertença. “Comecei a participar da Sociedade de Psicologia, uma maneira de eu enxergar mais psicólogos. Este movimento da sociedade foi apoiando um embrião muito importante, de pertença, de poder, que depois originou o Conselho. Eu sabia como eram os psiquiatras, que vinham da Medicina, o que para mim não era novidade. Meu pai era médico, eu estava acostumada com o pessoal da Medicina. Assim que começou a movimentação do Conselho, me interessei muito”.

Com a terceira gestão do CRPRS veio a conquista da sede própria, uma sala em um prédio localizado na Avenida Osvaldo Aranha. “Eu lembro de uma sensação de alegria, de estar num lugar agora próprio, o quanto isso era importante. Porque não ter curso de Psicologia, não ter Conselho, nos dava a sensação de não ter lugar, de não existência e de não pertença. E a pertença era muito valiosa”, declara Silvia. A força do coletivo também foi uma lição aprendida durante seu tempo integrando uma gestão do CRP. “Quando precisamos conquistar uma coisa muito valiosa, que ainda não está disponível, não dá pra ser sozinho, precisa ser em coletivo. Hoje eu consigo chamar de coletivo. Na época, eu não sabia nomear isso. Ter o CRP é uma identidade.”
O segundo e o terceiro plenários também foram responsáveis pela revisão do Código de Ética Profissional, reunindo contribuições regionais que resultaram na publicação da terceira versão do Código de Ética da profissão em 1987.
Foto 1: Inauguração da Sede do CRPRS na Av. Osvaldo Aranha em 1980
Foto 2: Posse do III Plenário

Silvia Brandão Skowronsky | CRP 07/00131
III Plenário | 1980 – 1983
III Plenário | 1980 – 1983
Ciência x ideologia

Os primeiros plenários do CRPRS estavam empenhados em firmar a Psicologia como uma ciência. “Naquela época, havia o debate se a Psicologia era ciência ou ideologia. Discutíamos muito se, diante da existência de tantas Psicologias, essa área era mesmo uma ciência. Nós queríamos provar isso e o modelo que inspirava todo esse trabalho era um modelo positivista em que era preciso haver neutralidade. A/O profissional não podia se envolver afetivamente com o seu objeto de estudo. Nosso desafio foi escapar dessa inflexibilidade das ciências naturais, mostrar que a Psicologia era uma ciência humana, uma ciência social. Razão pela qual os parâmetros das ciências naturais não se aplicam propriamente à Psicologia”, explica Marlene Neves Strey. Diante da abertura política da época, o desafio era mostrar o papel político e social da Psicologia: “a quem se dirigiria o nosso trabalho, o nosso pensamento e as nossas ações?”
E essas reflexões começaram a ser levadas para dentro das universidades. “Nós queríamos que as/os estudantes de Psicologia se envolvessem mais com esses posicionamentos da/o psicóloga/o enquanto cidadã/ão, ser político, ser social, que isso fizesse parte das disciplinas que estavam sendo oferecidas pelos cursos”, explica Marlene.
Foto: IV Plenário do CRPRS

Marlene Neves Strey | CRP 07/00985
IV Plenário | 1983 – 1986
IV Plenário | 1983 – 1986
Valorização da Psicologia em diferentes campos e início da descentralização do CRPRS

Em 1986 o processo eleitoral para a gestão do CRPRS teve a participação de duas chapas concorrentes, conforme relata Marisa Campio Muller (CRP 07/00993), conselheira do quinto plenário (1986-1989). “A nossa proposta era trabalhar pela profissão, pela imagem da/o psicóloga/o, pela conscientização do que é ser psicóloga/o e qual era o nosso papel junto à comunidade, junto à população, dentro de um cunho político/social. Havia um descontentamento muito grande por parte das/os psicólogas/os, em função do distanciamento que havia entre o Conselho e a categoria. Estávamos num momento político de maior abertura e isso permitia que pudéssemos proporcionar várias atividades na Sede do Conselho. Nosso foco, então, foi direcionado a aproximar a categoria, tornando o Conselho a ‘casa da/o psicóloga/o’. Assim sendo, criamos vários grupos de trabalho: Coordenadores dos Cursos de Psicologia, que determinou uma nova configuração dos currículos de alguns cursos; Supervisores de Estágios, que originou um novo modelo de estágio; psicólogas/os da área da Psicologia do Trabalho, que traziam os aspectos de saúde mental e adoecimento do trabalho; representantes de Hospitais Gerais e Prontos Socorros de Porto Alegre; um longo trabalho com psicólogas/os da área do trânsito; psicólogas/os da Área da Saúde Mental de Porto Alegre; psicólogas/os da Área da Educação. Esse movimento contava com a participação de mais de cem psicólogas/os. Realizamos três grandes jornadas internas desses grupos objetivando partilhar o que acontecia e reforçar a linha condutora. Pode parecer estranho esse desenho, mas os colegas reforçavam que pela primeira vez se sentiam pertencendo e colaborando com o Conselho. Foi criado o Ponto de Encontro, que acontecia bimestralmente, onde diferentes temas eram discutidos dentro do que ocorria na sociedade e dos grupos de trabalho.”

Durante o quinto plenário também foi adquirida uma nova sala que, pela disposição física, proporcionou uma locomoção interna, “essa também se tornou um auditório”.
Um dos momentos mais marcantes do quinto plenário foi a organização do Congresso Brasileiro de Psicologia do Trabalho, em parceria com a Sociedade de Psicologia. O evento contou com a participação do psicólogo espanhol Ignácio Martin Baró, trazendo discussões extremamente importantes para o campo da Psicologia do Trabalho. Houve também a participação de convidadas/os de vários estados brasileiros, contando com a presença de mais de mil psicólogas/os.

De 1986 a 1989, o processo de interiorização ou descentralização, como é chamado hoje, ganhou força no CRPRS. “Nós fomos até os núcleos maiores de psicólogas/os, isso nunca havia acontecido. Fomos até Caxias do Sul, Santa Maria e Pelotas, nos reunindo, chamando as pessoas, conversando sobre o que era o Conselho, sua função e como se organizava. Foi um trabalho árduo e de muita paciência, de levantar assuntos, temas de interesse da Psicologia, e mobilizar as pessoas para as atividades em Porto Alegre.”
Além disso, o CRPRS começou a ir até as universidades participando de encontros no início de cada semestre. A inserção de estudantes de Psicologia nas Comissões do CRPRS começou a ser defendida neste momento. “Consultamos o CFP sobre essa possibilidade e houve um estranhamento. Por que chamar alunas/os se esse espaço não era delas/es? Argumentamos que era um momento de construção, não havia nada pronto ou estabelecido, e acreditávamos que a participação dos estudantes seria de grande importância. Sabíamos que estávamos vivendo um momento diferente. Tínhamos que dar alma para esse Conselho”, resgata Marisa citando uma liderança importante durante esta gestão, a da psicóloga Maria Helena Souza, primeira conselheira presidenta negra do CRPRS.
Para Marisa, o principal objetivo da gestão foi cumprido. “O Conselho foi invadido pelas/os psicólogas/os a partir do trabalho desenvolvido, do crescimento que acontecia e do muito entusiasmo dos envolvidos: o CRP havia adquirido um sentido para continuar!”.
Foto 1: Eleições no CRPRS
Foto 2: V Plenário do CRPRS
Foto 3: Reprodução de jornal do CRPRS sobre o Encontro Nacional de Psicologia do Trabalho realizado em 1986

Marisa Campio Müller | CRP 07/00993
V Plenário | 1986 – 1989
V Plenário | 1986 – 1989
Psicologia nas políticas públicas e compromisso social
Se economicamente a década de 1980 foi instável, política e culturalmente foi uma década muito rica, de muitas conquistas diante do processo de redemocratização, do processo constituinte e do nascimento do Sistema Único de Saúde (SUS) em 1988. Para Sandra Maria Sales Fagundes (CRP07/01644), que integrou o sexto plenário do CRPRS (1989-1992), a retomada da democratização do país foi um momento de extrema importância para a Saúde, com a inserção da Psicologia nessa política pública. “Era um momento de muita efervescência de participação da Psicologia, com a oitava Conferência Nacional de Saúde, que gestou o Sistema Único de Saúde, e o período da constituinte de 1988. O Conselho tomou a iniciativa de constituir uma Comissão de Saúde – organização que reunia representantes das três principais entidades da Psicologia: Conselho, Sindicato e Sociedade – diante do maior número de psicólogas/os que começavam a se inserir na Saúde, principalmente por concursos públicos. Então, surge a necessidade de acumular mais sobre essa prática e articular as/os psicólogas/os. Discutíamos como fortalecer a prática de psicólogas/os em políticas públicas democratizantes. O intercâmbio com outros países da América Latina e Central contribuiu para esse processo e o Conselho era um espaço importante para essa articulação.”
Sandra lembra de algumas mudanças de paradigmas importantes para a profissão na época. “A Saúde do Trabalho tensiona e transforma a Saúde Organizacional. A prática da/o psicóloga/o nas políticas públicas passa a ser de um agente apoiador de processos emancipatórios da população na sociedade”.
A gestão de 1989 a 1992 surge para reforçar a interlocução com a sociedade nesse período de democratização e questionar, até mesmo, a existência do próprio Conselho. “Uma das nossas ocupações enquanto plenário era pensar qual era a melhor forma de organização das/os psicólogas/os. Não negávamos que havia a necessidade de uma articulação, mas os Conselhos, para nós que vínhamos de uma ditadura, faziam parte de um ‘entulho autoritário’ que podia não ser a melhor configuração de organização para as/os profissionais.” Diante dessa inquietude, a gestão não encontrou uma outra configuração, mas iniciou um processo de abertura na participação da categoria no Sistema Conselhos. “Uma das consequências dessa reflexão foi a abertura de espaços participativos que chegaram aos Congressos, um sistema que trabalha de forma colegiada”.
O compromisso da Psicologia e das/os psicólogas/os em sua prática com a sociedade, com a transformação da sociedade, quebrando, de certa forma, uma prática corporativa foi a marca desse período. “Reconhecendo a desigualdade de nossa sociedade, buscando a equidade, trabalhando pela população invisibilizada, na construção e empoderamento das/os trabalhadoras/es. Nesse contexto chegamos às políticas públicas. Temos uma mudança de paradigma importante: o compromisso social passa a ser o direcionamento de nosso trabalho. Passamos a trabalhar para uma sociedade mais justa e menos desigual”, resgata Sandra.
A transdisciplinaridade também surge como pauta nas discussões da Psicologia. Em 1991 foi organizado o Encontro Nacional de Psicologia do Trabalho, que buscou traduzir - ou ser coerente com - esse propósito da democratização da Psicologia junto à sociedade e marcar essa atuação transdisciplinar. “Trouxemos a voz da/o trabalhadora/or, com a participação, por exemplo, da CUT, de cientistas sociais, em um debate que nos enriqueceu em relação à possibilidade de construção de pensamento e práticas”.

Sandra Maria Sales Fagundes | CRP 07/01644
VI Plenário | 1989 – 1992
Aproximação com os movimentos sociais

Outro movimento que surgia na época e que recebeu o apoio do Conselho Regional de Psicologia foi o da luta antimanicomial. “Nós tensionávamos muito para a máquina do Conselho conseguir apoiar e levar usuários, por exemplo, para importantes marchas. Falávamos tanto da Psicologia para a sociedade, precisávamos sair do discurso, apoiar os movimentos sociais”. E esse entendimento não era unanimidade. “Naquela época, as forças que recém tinham vindo da ditadura estavam mais silenciosas. Elas não tinham acabado, estavam silenciosas e envergonhadas. Não se falava contra os direitos humanos ou contra as desigualdades. À medida em que o tempo foi passando, passamos a questionar a democracia e, hoje, temos um movimento de direita desavergonhado”, avalia Sandra ressaltando toda a dificuldade que é um processo efetivamente democrático e participativo.
A gestão seguinte no CRPRS (1992-1995) fortaleceu ainda mais essa aproximação com os movimentos sociais. “A Gestão Construindo com as Diferenças iniciou com o desafio de compor de forma plural a própria plenária, com pessoas que vinham de áreas e inserções diversas”, resgata Maria de Fátima Bueno Fischer (CRP 07/01399). O Brasil vivia o momento dos caras pintadas e do impeachment do presidente da época, Fernando Collor de Mello. “Nossa gestão pegou o período do Governo Itamar, num mandato tampão, época de muita conciliação no cenário político nacional.”
“Nesse período, precisávamos de instituições fortes que nos referenciassem e nos constituíssem como sujeitos de direitos, e a Psicologia vem para contribuir nesse papel. Se por um lado, tínhamos ainda uma parte da categoria, representada na nossa gestão, focada na construção da Psicologia do ponto de vista mais corporativo, havia, por outro, um grupo trabalhando para a Psicologia se constituir enquanto campo de ciência, de profissão, inserido e cumprindo o seu papel ético, social e político com a sociedade”, declara Fátima.

A inserção da Psicologia nas instâncias de Controle Social, que começavam a se organizar, também é uma marca desse período. “Tivemos experiências bonitas com a nossa participação nos Conselhos Municipal e Estadual da Saúde. Era o início das políticas públicas. Lembro que dizíamos: onde a sociedade está, a Psicologia vai junto.”
Os anos 90 também iniciam com toda movimentação em busca da promulgação da Lei da Reforma Psiquiátrica no estado, como lembra Fátima. “Foi uma das coisas mais lindas, mais significativas, que instituiu uma mudança fundamental no cuidado em saúde mental, com a presença fundamental da Psicologia e do Sistema Conselhos. Estivemos em mais de 200 municípios, participando de discussões sobre saúde mental, para problematizar e sensibilizar a sociedade para essa questão. Também participamos de programas de rádio e TV falando sobre a loucura. O que adianta fechar os hospitais psiquiátricos se a sociedade não estabelecer uma outra relação com a loucura? Eu dizia que tinha que ser uma revolução cultural pois, ainda hoje, a gente estranha o diferente, a gente se estranha com a loucura e qualquer outra forma de exclusão. O Conselho tinha o papel de produzir e provocar muito essa discussão pública.”
Fátima resgata que o Conselho esteve à frente da organização do primeiro Seminário Internacional de Saúde Mental, na Assembleia Legislativa, que reuniu em torno de 1500 pessoas. Nesse Seminário foi produzido o documento São Pedro Cidadão. “Durante todo o ano de 1992, o Conselho teve um espaço de discussão do São Pedro para fora. Olhando para esse movimento, podemos dizer que foi o início do processo de desinstitucionalização. A Semana Louca Vida, organizada durante o mês de agosto, mês da Psicologia, ampliou o debate sobre a loucura para toda a sociedade. Um evento na Usina do Gasômetro que estava propondo uma outra forma de viver a loucura, com teatro de rua e outras manifestações culturais.”
A participação de estudantes nos processos do Congresso Nacional da Psicologia teve início nesse período. Além disso, a Gestão Construindo com as Diferenças iniciou uma experiência para acompanhar as/os novas/os profissionais, uma transição entre a formação e o primeiro ano de atuação profissional. Em 1992 foi publicada a Carta de Serra Negra, documento com princípios orientadores da formação. Uma síntese do encontro, promovido pelo Conselho Federal de Psicologia, reunindo representantes de todos os Cursos de Psicologia do país.
Foto 1: Publicação do CRPRS destaca aprovação da Reforma Psiquiátrica
Foto 2: II Encontro Nacional de Supervisores de Estágio na Formação do Psicólogo em 1993

Maria de Fátima Bueno Fischer | CRP 07/01399
VII Plenário | Construindo com as diferenças | 1992 – 1995
VII Plenário | Construindo com as diferenças | 1992 – 1995
Profissionalização e reorganização

Em 1995, o CRPRS passou por um momento delicado, com insatisfação de grande parte da categoria com a forma como estava sendo conduzida a gestão, no sentido de uma orientação voltada predominantemente para a luta antimanicomial, deixando de acolher outras demandas da categoria. Também estava sendo questionado o processo eleitoral que transcorria na época. Neste momento, uma Junta Governativa assume a gestão do CRPRS em um processo de intervenção.
De 1996 a 1998, a Gestão Resgate esteve à frente do CRPRS e optou por dar maior espaço a outras pautas de interesse da Psicologia. “As gestões anteriores eram mais restritas à questão da luta antimanicomial, deixando de dar tanta atenção para outros eixos da Psicologia. Nossa chapa se organizou para, de certa forma, fazer frente a isso. A proposta era fazer uma revisão do funcionamento do Conselho – incluindo o aspecto organizacional da instituição – para ampliação das questões que afetavam todas/os as/os psicólogas/os. Também focamos nossa atuação na tentativa de reverter a inadimplência”, lembra Branca Regina Chedid (CRP 07/00610).

“Nossa gestão trabalhava para resgatar a credibilidade do CRP no âmbito regional e nacional, implantar um sistema de planejamento orçamentário e organizar um planejamento estratégico. Buscávamos aproximar a categoria de suas entidades representativas: conselho, sindicato e demais instituições. Foi contratada uma assessoria para organizar núcleos setoriais, promover uma integração com movimentos sociais que apontavam para a construção da cidadania, além de incentivar a criação de comissões temporárias e permanentes”, cita Branca.
As funções do CRPRS de orientação e fiscalização também foram o enfoque dessa gestão. “Contratamos psicólogas/os fiscais para atender a categoria. Havia uma demanda reprimida de denúncias. Foi um momento de profissionalização da entidade.”
A importância de o Conselho dar visibilidade a questões contemporâneas e inseri-las em suas pautas é destacada por Branca, uma constatação que não estava tão presente nas gestões anteriores. “O Conselho é um espaço para dar passagem a questões contemporâneas, como racialidade, gênero e etarismo. Tem que haver essa representação para ser um Conselho vivo. Durante nossa gestão, trabalhamos na tentativa de dar vazão a demandas políticas e sociais que atravessavam e atravessam as/os psicólogas/os na sua inserção no mundo do trabalho em suas múltiplas vertentes, tanto na esfera pública quanto na privada”, avalia Branca.
Foto 1: Publicação do CRPRS elucidando sobre Junta Governativa de 1995
Foto 2: Gestão Resgate assume no CRPRS

Branca Regina Chedid | CRP 07/00610
VIII Plenário | Resgate | 1996 – 1998
VIII Plenário | Resgate | 1996 – 1998
Políticas Públicas e Interdisciplinaridade em pauta no CRPRS
Lúcia Maria Bertini (CRP 07/03312), integrante da Gestão Conexão (1998-2001), lembra do momento de uma categoria ainda receosa de se inserir na luta coletiva em defesa da consolidação do processo democrático. “Tínhamos uma democracia ainda jovem, fazíamos um movimento coletivo cuidadoso, mas, ao mesmo tempo, tínhamos muitas coisas a recuperar, a garantir e a conquistar. Eu tenho muito orgulho da Psicologia, desse movimento de protagonismo feito pelo Conselho, pelo Sindicato e pela Federação Nacional dos Psicólogos.”
Entendendo o importante papel da Psicologia na construção deste cenário, é criado, na gestão de 1998-2001, o Grupo de Trabalho de Políticas Públicas, que mais tarde virou a Comissão de Políticas Públicas, campo de atuação em pleno crescimento. Nesse período se inicia a organização da publicação do CRPRS “Psicologia e Políticas Públicas Experiências em Saúde Pública”, lançado pela gestão seguinte e que se tornou referência sobre o tema, reunindo experiências de profissionais inseridos nas políticas públicas. O livro contribui de forma efetiva para a discussão de estratégias de intervenção no campo da formação, na rede de saúde pública e nos espaços de organização profissional.
“Era um momento de transformação. Conseguimos entender melhor os profissionais e, principalmente, direcionar a categoria no que diz respeito ao que é ser psicóloga/o e o que a profissão pode vir a transformar. Começamos a fazer uma aproximação mais efetiva”, avalia Lúcia.
A interdisciplinaridade também ganha mais uma vez força nas ações do Sistema Conselhos. “Vamos percebendo que há outros saberes dos quais precisamos receber informação e aos quais precisamos dar informação, com quem precisamos trocar e ‘nos misturar’ para criar uma intersetorialidade que acolha a compreensão da complexidade do momento em que vivemos. E acho que isso é muito atual ainda, né? Ninguém sozinho dá conta nas políticas públicas. Por exemplo, quando a gente vai fazer uma discussão sobre o SUS, vai ter que se juntar com outras categorias porque o tema é transversal e, na sua complexidade, nos dá a possibilidade de colocar a Psicologia dentro do processo de transformação, de compreensão e de apreensão dessa realidade. O que vejo é que, nesse momento, a Psicologia responde não só por recursos humanos, mas também por direitos humanos. Isso passa a ser um lugar comum que a gente começa a conversar e que, até então, não era falado dessa forma. Você começa a se dar conta que você tem uma ética, que ela não é uma ética da categoria. É uma ética política, uma ética que vai olhar para as pessoas e, nessa condição, você vai trabalhar com direitos humanos. A marca da nossa gestão é, portanto, discutir políticas públicas, discutir direitos humanos.
Lúcia defende a necessidade de seguir construindo um “Conselho combativo”. “O trabalho da Psicologia precisa estar em dia com a realidade da categoria e não necessariamente à disposição de um status quo vigente e sistemático, sempre atento ao que está acontecendo no nosso mundo, no nosso país e, particularmente, no nosso estado e município, pois é também onde estamos. Um Conselho que está atento consegue fazer uma orientação ética mais eficiente.”

Lúcia Maria Bertini | CRP 07/03312
IX Plenário | Conexão | 1998 – 2001
Fortalecimento da Psicologia

Maria da Graça Correa Jacques (CRP 07/00023), que integrou dois plenários (2001-2004 e 2004-2007), contextualiza as discussões da época para a Psicologia. “Havia uma dicotomia muito grande entre o que era a profissão no mercado de trabalho e o que era a produção científica da Psicologia dentro da academia. A Psicologia começou a fazer uma revisão dos seus princípios, das suas práticas. Era um momento histórico de relevância. O Conselho Federal, que vinha de uma tradição muito alinhada ao modelo mais conservador, teve uma mudança significativa.” Graça lembra da autonomia que sempre foi marca do CRPRS. “Antes dessa mudança no Federal, tínhamos posicionamentos diferenciados e uma certa autonomia. Éramos oriundos da Academia, pessoas que tinham um certo nome dentro da comunidade científica da Psicologia, e isso foi muito importante para posicionarmo-nos diante do Conselho Federal de Psicologia.”
A construção da representação da Psicologia na sociedade ainda era necessária, como cita Graça. “Hoje todo mundo sabe o que a/o psicóloga/o faz, há um respeito à Psicologia. Mas antes não era assim. Nós construímos na sociedade essa representação.”

Para Graça, a atuação do Sistema Conselhos de Psicologia deve priorizar a qualidade do fazer Psicologia e a produção de conhecimento. “O Conselho deve fazer isso: aproximar-se da sociedade e atender essas demandas que o mundo, que o contexto contemporâneo nos traz”. Durante esses anos, buscou-se uma valorização das/os funcionárias/os do CRPRS. “As/Os funcionárias/os é que estão lá no dia a dia do Conselho. Nós, conselheiras/os, somos temporários. Então, uma das coisas que a gente procurou fazer foi essa aproximação com a equipe de funcionárias/os. Com isso, percebemos que o espaço físico que tínhamos para atender a categoria estava extremamente restrito. Precisávamos de uma sede nova”.
A Gestão Inserção chegou a adquirir uma casa no bairro Petrópolis, em Porto Alegre, mas diante da necessidade de grandes reformas, a gestão seguinte optou por vender esse imóvel e ir em busca de um novo espaço, chegando até o prédio onde está localizada a atual sede do CRPRS, na Avenida Protásio Alves. “Essa foi uma das nossas grandes conquistas”, lembra Graça.
A aproximação com as universidades também foi uma marca dessas gestões, que deram início às solenidades de entrega da Carteira de Identidade Profissional. “Começamos a trazer a universidade para dentro do Conselho. Não foi uma tarefa fácil. Começamos essa aproximação com os supervisores de estágio, discutindo essa interface entre exercício profissional e docência”, lembra Graça. “Uma das grandes discussões em que o CRPRS se engajou naquele momento foi sobre os currículos dos cursos de Psicologia e seu caráter generalista, além da certificação das especialidades no exercício profissional pelos Conselhos Regionais”. A necessidade de levar as discussões para outras regiões do estado também ganha destaque. “Começamos a ver que não podíamos estar só em Porto Alegre, Pelotas e Caxias do Sul, tínhamos que ir a outros lugares do Rio Grande do Sul. Então, começamos a fazer eventos nas universidades. Isso nos aproximou de profissionais que antes não tinham nenhum envolvimento com o Conselho.”
Iniciando as comemorações dos 35 anos do CRPRS, a Gestão Pra Psis (2004-2007) deu início a um projeto de resgate histórico, reunindo representantes dos plenários anteriores em reuniões do Grupo de Trabalho de História. O projeto resultou em uma publicação especial e no lançamento de um documentário, que resgata a trajetória dos quatro primeiros plenários do CRPRS.
Foto 1: Inauguração da Sede do CRPRS na Av. Protásio Alves em 2006
Foto 2: Participação da Psicologia no Fórum Social Mundial em Porto Alegre

Maria da Graça Correa Jacques | CRP 07/00023
X Plenário | Inserção | 2001 – 2004 e XI Plenário | PraPsis | 2004 – 2007
X Plenário | Inserção | 2001 – 2004 e XI Plenário | PraPsis | 2004 – 2007
A Psicologia e sua implicação social
Também integrando a Gestão Pra Psis (2004-2007), Neuza Maria de Fátima Guareschi (CRP 07/01309) recorda que o Congresso Nacional da Psicologia (CNP) de 2004 marcou a proposta de começar a politizar a Psicologia, no sentido de promover maior participação e implicação da profissão com a sociedade brasileira, ressaltando seu protagonismo social. “Isso tinha tudo a ver com a questão do Banco Social de Serviços que a Psicologia e o Sistema Conselhos tinham iniciado. Antes de existir o Centro de Referência Técnica em Psicologia e Políticas Públicas (CREPOP), existia esse Banco, com a intenção de organizar dados para as/os profissionais da Psicologia que começavam a atuar nas políticas públicas, principalmente na área da Saúde. O Sistema Conselhos de Psicologia foi muito importante para dar suporte às/aos profissionais que estavam atuando nesse campo. Poucos anos depois, em 2006, surgiu o CREPOP.”
Neuza lembra que, na época, começavam a emergir programas que tinham participação importante da Psicologia, como, por exemplo, a política de redução de danos e a política de acolhimento. “Foi uma gestão de muitas atividades, muitos eventos. Lembro que fizemos um evento só com as psicólogas que trabalhavam na Fundação de Atendimento Socioeducativo do RS (Fase), voltado às medidas socioeducativas. Vimos o quanto aquelas profissionais estavam carentes de uma discussão sobre a sua atuação dentro da perspectiva das políticas públicas e dos direitos sociais. Isso foi muito interessante.”
Na área da saúde mental, fizemos alguns intercâmbios com profissionais do Uruguai e da Argentina. "Vivíamos um recomeço. Agora, as/os profissionais tinham que ter outro protagonismo, outra atuação em relação ao sujeito dessas políticas públicas, que estão em busca de seus direitos de acessos. Não podíamos seguir com uma postura de assistencialismo. Também foi durante nossa gestão que teve início o Grupo de Trabalho de Psicólogas/os do Sistema Prisional. A intenção era pensar a atuação da/o Psicóloga/o como uma/um profissional de saúde e não mais como aquela/e profissional que fazia avaliação psicológica para progressão de pena e outras questões."
Para a formação, 2004 também foi um ano muito importante com a aprovação das Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs) da Psicologia, passando a estruturar as ênfases nos cursos. “A formação deixou de ser por áreas, como clínica e organizacional, e passou a se pensar em ênfases, atendendo às demandas do contexto social pós-Constituição, especialmente no campo das políticas públicas. Isso demandava das/os profissionais da Saúde uma outra atuação, com uma perspectiva de saúde coletiva e não mais biomédica, dando atenção à cultura do sujeito e à história dele, sempre buscando a promoção de vida”, contextualiza Neuza.

Neuza Maria de Fátima Guareschi | CRP 07/01309
XI Plenário | PraPsis | 2004 – 2007
A vez da Assistência Social
Em 2005 é instituído o Sistema Único de Assistência Social (SUAS). “O SUAS vem exatamente dessa demanda de atuação que estávamos tendo na Saúde, aliada à necessidade de aumentar a rede, pensando na perspectiva do sujeito dos direitos sociais. A atuação da Psicologia, tanto na Saúde quanto na Assistência Social, visa à promoção das condições de vida, traduzida pela busca da saúde mental”, explica Neuza Maria de Fátima Guareschi (CRP 07/01309).
Refletindo sobre a importância da contribuição social da Psicologia e do próprio CRP, Neuza destaca a importância da autarquia se manter aberta e promovendo uma troca permanente com a sociedade. “Quando a gente entra no Conselho, surgem demandas legais, burocráticas, administrativas que vão, de certa forma, nos fechando. Deixamos de prestar atenção na categoria, na sociedade. Então, ao longo dessa minha trajetória no Sistema Conselhos, eu diria que o Conselho precisa ser aberto, ter uma discussão permanente com as pessoas que estão fora, uma avaliação e uma devolução permanente.”
Conquistas na área da Saúde Mental

O final da primeira década dos anos 2000 foi marcado por uma aceleração do crescimento e uma expectativa otimista. “Havia muitos investimentos nas políticas públicas, muitos avanços na Saúde, especialmente na saúde mental, com várias Portarias e Resoluções sendo publicadas pelo Governo Federal, que davam conta de uma saúde integral. Além disso, muitos concursos públicos estavam acontecendo, uma vez que as políticas estavam em crescimento e abriam-se muitas possibilidades de trabalho, especialmente para a Psicologia”, avalia Ivarlete Guimarães de França (CRP 07/08042) da Gestão Plural Psi (2007-2010).
O CRPRS acompanhava esse movimento, firmando-se como um espaço de construção. “A Comissão de Políticas Públicas torna-se uma Comissão extremamente atuante. Contribuíamos principalmente na formação de psicólogas/os de todo o estado do Rio Grande do Sul para atuar como conselheiras/os nas instâncias do Controle Social. Era um trabalho muito articulado e integrado, para que a/o profissional não se sentisse sozinha/o e pudesse defender posições do Conselho nesses espaços.”
Duas grandes Conferências Nacionais aconteceram nesse período, pela primeira e única vez: a da Comunicação Social e da Segurança Pública, ambas realizadas em 2009.
Outra grande mobilização nacional que contou com a participação do CRPRS foi em defesa da Reforma Psiquiátrica. “Fomos até Brasília, lotando dois ônibus, para participar de uma grande manifestação para que a Conferência Nacional de Saúde Mental ocorresse. Sabíamos que a saúde mental, o SUS e a reforma psiquiátrica sempre estiveram em cenários de disputa e a Psicologia sempre esteve à frente dessas lutas ao lado da sociedade. Isso acontece até hoje. Sabíamos que anular o debate sobre esses temas enfraquece toda uma luta que ainda precisa ser feita”, afirma Ivarlete.
Foto: Funcionárias/os e Gestão Plural Psi em 2008

Ivarlete Guimarães de França | CRP 07/08042
XII Plenário | Plural Psi | 2007 – 2010
XII Plenário | Plural Psi | 2007 – 2010