DICAS CULTURAIS

  Filme  

Contágio

 
Um vírus se origina na China e, devido a fatores como a globalização, se espalha rapidamente por diversos países. A rapidez de disseminação e as altas taxas de hospitalização e letalidade preocupam as autoridades dos países já atingidos. Apesar da possível ligação com o consumo e a venda de animais silvestres, a forma de contágio entre os humanos e as causas dos agravamentos são desconhecidos.
 
Enquanto cientistas e órgãos de saúde buscam solucionar tais questões chaves para chegar a imunização ou cura, as pessoas são orientadas a manter distanciamento e isolamento social para evitar o contágio. Porém, essa simples orientação traz consigo inúmeros novos problemas. Em pouco tempo, a doença deixar de ser o foco, passando para os problemas sociais que ela produziu. Ao mesmo tempo, governantes se esquivam e menosprezam a seriedade do momento, o medo da fome e do contágio faz com que pessoas se exponham e se agridam na busca por auxílio e também revela outro inimigo: a disseminação de informações falsas.
 
Essa narrativa é sobre o filme “Contágio”, suspense lançado em 2011, mas encaixa-se perfeitamente na situação vivenciada em 2020 devido à pandemia causada pelo novo coronavírus. As semelhanças são assustadoras e nos levam a questionar uma possível premonição por parte dos criadores. A verdade é que, mesmo antes da chegada da pandemia, a ciência já antecipava que o nascimento de um vírus com alta capacidade de transmissão e hospitalização – mesmo com índice de letalidade não tão alto como na ficção – poderia trazer à tona este cenário de emergência e colapsar a maior parte dos sistemas de saúde do mundo. O que não contávamos, talvez, era com a incapacidade dos governantes de lidarem com essa situação, o que gerou ainda mais insegurança e pânico na população.
 
O fantástico da trama está em justamente trazer para a ficção e transformar em terror aquilo que hoje é real para todos nós: o medo do contágio, a confusão da desinformação, a falta de empatia e o caos que podemos esperar a partir do momento em que hospitais e mercados passam a ser invadidos e o potencial da doença é desacreditado e até rechaçado por alguns governantes.
 
Dalmara Fabro de Oliveira (conselheira do CRPRS)
 
 

  Filme  

O Poço

 
Lançado em 2019 e dirigido por Galder Gaztelu-Urrutia, “O Poço” retrata uma prisão estruturada em andares na qual os personagens estão inseridos por diferentes motivos. Diariamente, ao soar de uma sirene, uma enorme plataforma desce para alimentar cada andar. O nível zero produz o consumo e possui abundância, já aos outros 333 andares – com duas pessoas por andar – cabe a administração do alimento para servir a todos.
 
Os prisioneiros permanecem um mês em cada andar, por uma definição aleatória. Aos poucos, vamos entendendo que, se houvesse uma divisão racional dos alimentos, sobraria o suficiente para o andar seguinte comer. Entretanto, isso não acontece e, enquanto uns se fartam, abusando do seu privilégio de estarem nos andares mais altos, menos sobra para os que estão abaixo.
 
O filme nos mantém em estado de tensão, enquanto expõe os efeitos danosos da divisão de classes, chamando nossa atenção para os modos competitivos e excludentes que estruturam este tipo de organização social.
 
Em alguns momentos é difícil suportar a força dos afetos, por evidenciarem aspectos da humanidade que poderíamos considerar inaceitáveis. Entretanto, nos faz ver que situações idênticas acontecem cotidianamente e muitas vezes não buscamos modificá-las, podendo inclusive serem banalizadas. Ao mesmo tempo, nossa atenção é capturada pela sucessão de acontecimentos, talvez pelo desejo de que possamos ter um “final feliz”, que possa aliviar a sensação, crescente ao longo do filme, de desesperança na humanidade.
 
Vera Lucia Pasini e Dalmara Fabro de Oliveira (conselheiras do CRPRS)
 
 

  Literatura  

Sonhos no Terceiro Reich: 

 
Charlotte Beradt (1907-1986) coletou relatos de sonhos de mais de 300 pessoas, a grande maioria não simpatizantes ao governo, ao menos de forma consciente, e publicou um livro em 1966. Os sonhos foram coletados entre 1933 e 1939 na Alemanha. Ela nasceu em uma família judia e trabalhou como jornalista e crítica teatral. Os sonhos relatados expressam uma invasão daquilo que é tido como público no espaço privado são os sonhos impulsionados pela ditadura. É possível perceber nos relatos o clima de “medo e repulsa” presente mesmo antes dos campos de concentração em massa e do aniquilamento de milhões de pessoas. Beradt não toma os sonhos como profecias, ainda que os (as) sonhadores (as) não soubessem do que estava por vir, nem faz uma análise psicológica ou sociológica, mas os compreende como expressões da “sensibilidade aguçada” de pessoas que captaram sinais sutis de uma realidade impensada e absurda que estava a ser gestada.
 
Daniela Duarte Dias (conselheiras do CRPRS)