Tempo é surpresa, destino é ironia. Como poderíamos prever a experiência de uma pandemia que se espalha por todo o tecido social e afeta até o mais detalhado espectro da vida cotidiana? Quem imaginaria que, com os avanços científicos e tecnológicos, o modo mais eficaz de proteção seria uma mudança no comportamento coletivo? O isolamento social permite conter a cadeia de contágio mapeando as relações entre as pessoas e sua circulação pela cidade – simples, mas tão difícil. É sofrido isolar-se. Mesmo conscientes do risco da aglomeração, da circulação e do contato, ainda assim nos custa muito o distanciamento das pessoas importantes em nossas vidas, a impossibilidade das trocas cotidianas, as restrições para sair e trabalhar, a insegurança econômica. Não podemos circular por lugares que nos fazem bem e dão sentido ao dia-a-dia. Permanecemos confinadas/os no mesmo espaço que antes da pandemia era porto seguro, mas hoje pode até se assemelhar a um cárcere. Sentimos crescer a angústia, o peso do passar dos dias e é até possível sentir-se enlouquecendo, talvez.
Quem diria que a solidão nos ensinaria que somos gregárias/os? Que um vírus nos ensinaria o privilégio e o valor do autocuidado? E o isolamento, o valor da liberdade!
Temos aprendido muito sobre os prejuízos sociais e psíquicos que isolar-se produz. Saber que este é um sacrifício temporário torna-o mais suportável… mas e se o confinamento não tivesse fim?
Curiosamente, enquanto hoje nos isolamos por nossas vidas, ainda lidamos com a herança de termos inventado um método de isolamento que só promove morte: o manicômio. Como sustentar que medidas de segregação e enclausuramento poderiam ser uma forma de tratamento mental, quando hoje sentimos na pele como elas adoecem e fazem sofrer?
Ainda existem muitos manicômios que habitam nossa forma de lidar com a diferença de ser e viver na sociedade. Loucura não é vírus que demanda isolamento. Devemos, de uma vez por todas, materializar os compromissos da Reforma Psiquiátrica Antimanicomial e enfrentar os “novos” modos de patologizar as diferentes formas de habitar o mundo.
- Fique ligada/o! Assista à live do CRPRS pela Luta Antimanicomial na segunda-feira, 25/05, às 19h. Em breve mais informações.
- Faça o dowload dos cartazes desta campanha:
- Conheça importantes iniciativas do Sistema Conselhos de Psicologia no enfrentamento de práticas manicomiais e violadoras de direitos ainda presentes em nossa realidade: