Ontem fez um ano que João Alberto de Freitas, homem negro de 40, foi assassinado por seguranças no estacionamento de um supermercado. Um ano que sua família espera por justiça, um ano que se tornou ainda mais temeroso ir ao supermercado, mas apenas para as pessoas negras, pois para as brancas ir às compras não passa de uma atividade cotidiana. E é por isso que hoje o nosso diálogo é com vocês, pessoas brancas.
Historicamente a branquitude associou a raça ao outro, ao externo, ao não branco, ou seja, às pessoas negras e indígenas. Contudo, “lamentamos” informar que vocês, brancos, também são racializados. Sim, isso mesmo, a raça é um marcador social criado para classificar e hierarquizar indivíduos e grupos humanos e a cada identidade racial são atribuídas e construídas determinadas características (bom/ruim, bonito/feio, honrado/suspeito, etc), que produzem efeitos materiais (econômicos, políticos e sociais).
A identidade racial branca é um lugar que carrega vantagens e privilégios, que são diariamente naturalizados pelo mito da democracia racial e pela ideia de meritocracia. A branquitude é acompanhada de privilégios simbólicos, subjetivos e materiais, querem ver?
75% da representação política no país é branca; 68% do cargos gerenciais são ocupados por pessoas brancas; a renda média do trabalhador negro é cerca de 55% menor que a do trabalhador branco; os negros representam 72,9% dos desempregados do país; as chances de um jovem negro ser assassinado no Brasil em comparação a um jovem branco é quase 3 vezes maior; entre os 10% mais pobres do país, 77% são negros, enquanto os brancos compoem 70,6% do décimo mais rico; das vítimas de homicídio no Brasil, 75,5% são negras.
Vocês já ouviram falar no “pacto narcísico da branquitude”? É um termo cunhado pela psicóloga Cida Bento, que vai explicitar como as pessoas brancas unem-se de forma consciente, mas também inconsciente, na defesa dos seus privilégios. É ele que faz com que haja um silenciamento por parte da branquitude ao presenciar atos racistas e violentos, que naturaliza a periferização, a subalternização e a criminalização da população negra.
E para que haja uma atuação dentro da Psicologia que seja efetivamente antirracista, é fundamental que as psicólogas brancas reconheçam-se enquanto seres também racializados, assumindo que ocupam um lugar social de privilégios e vantagens. E proponham-se a desconstruir cotidianamente, com ações práticas - seja na atuação profissional diretamente com o sujeito atendido, seja nas relações de trabalho, de estudo e até mesmo relações familiares ou de moradia - o racismo que estrutura a nossa sociedade. Somente assim poderemos caminhar para a construção de uma Psicologia verdadeiramente plural, antirracista, inclusiva e diversa.
Salve Zumbi dos Palmares!
Beto, Presente!
Dados: Atlas da Violência, 2017; PNAD/IBGE 2020; PNAD/IBGE 2019; Atlas da Violência 2021.