A Comissão de Cidadania e Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do RS realizou na manhã desta quarta-feira, 30/03, audiência pública para debater a situação das/os acolhidas/os pela Fundação de Proteção do Estado do RS – FPE. A audiência foi proposta pela deputada Sofia Cavedon (PT) diante do processo de reordenamento da Fundação e publicação de novo termo de cooperação técnica pelo Governo do Estado objetivando a contratação de clínicas especializadas para terceirizar esse trabalho.
Em 2019, o CRPRS manifestou-se publicamente acerca do que se compreende como uma situação de violação de direitos de Pessoas com Deficiência, até então residentes de abrigos da Fundação de Proteção Especial do Estado do RS (FPE), acolhidas em um espaço mantido pela Clínica Libertad, empresa privada contratada pelo Governo do Estado do RS. Visita técnica realizada em outubro de 2019 nas instalações da Clínica evidenciou a ausência de um projeto técnico qualificado que sustente as intervenções necessárias para atender as necessidades de sujeitos com graves transtornos de desenvolvimento (possivelmente acometidos de um sofrimento psíquico mobilizado pela brusca ruptura com seu ambiente e rotina).
Representando o CRPRS na audiência, a vice-presidente do CRPRS, Maynar Vorga, resgatou as ações já realizadas pelo Conselho referentes a esse tema. Em sua fala, Maynar destacou a forma violenta como essas pessoas, que estão sob a proteção do Estado, estão sendo tratadas e reforçou a importância do vínculo estabelecido com as/os trabalhadoras/es responsáveis por esse cuidado. “Existem políticas públicas previstas para atender essas pessoas que estão sendo jogadas, depositadas na Clinica Libertad, um lugar que fica cercado, longe de tudo, não tendo como manter uma mínima inclusão social. O vínculo de trabalho exige cuidados éticos e é algo construído durante um tempo. Em visita técnica realizada pelo CRPRS à Clínica Libertad constatamos que as/os profissionais contratadas/os por essa empresa não detinham conhecimento técnico a respeito das especificidades desse trabalho”. Além disso, Maynar pontuou a falta de diálogo entre Governo e instâncias do Controle Social e a delegação de responsabilidades que seriam do Estado para serviços privados.
Para a deputada Sofia Cavedon, relatos de trabalhadoras/es da FPE e da Clínica Libertad mostram o descaso como as/os acolhidas/os estão sendo tratadas/os. A ideia é organizar esses depoimentos e subsídios técnicos para que uma nova representação possa ser encaminhada aos órgãos competentes e ao Ministério Público. Também será agendada uma reunião com a secretária da Igualdade, Cidadania, Direitos Humanos e Assistência Social, Regina Becker. “Esse é um atendimento complexo e cercado de muita afetuosidade, laços e elos entre trabalhadoras/es e protegidas/os, acolhidas/os. A retirada e escolha da terceirização da FPE gera um trauma tanto para trabalhadoras/es como para as/os acolhidas/os. Esse trabalho, que é público, não pode ser substituído por parcerias que são descontinuadas, por serem contratos”, afirmou a deputada.
Representando o Sindicato dos Empregados em Empresas de Assessoramento, Perícias, Informações e Fundações Estaduais do RGS (SEMAPI), Rossana Vicente Ramos e Luiz Leonel Costa Rodrigues ressaltaram o autoritarismo e a falta de diálogo do Governo com relação a essa pauta. “É um processo sem transparência, sem diálogo com trabalhadoras/es, conselhos de direito ou conselhos profissionais. Exigimos da secretária respeito, diálogo, transparência e condições de trabalho, com a nossa participação efetiva nesse reordenamento da FPE”, declarou Rossana. “O Governo se nega a acolher e a conversar, segue tomando atitudes de desmonte das instituições em processo autoritário, sem diálogo. Não queremos que se repita o que aconteceu com a Clínica Libertá”, reforçou Luiz Leonel.
A audiência pública contou com o depoimento emocionado de diversas trabalhadoras da instituição. “Temos um vínculo construído ao longo dos anos, reconhecemos cada olhar, cada choro, qualquer som. Como as/os novas/os profissionais que irão realizar esse atendimento vão entender isso? É quase uma sentença de morte”, narrou uma das trabalhadoras.
Para Simone Romanenco, vice-presidente do Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente – CEDICA RS, a sociedade e o próprio Governo desconhecem a política pública da Assistência Social. “Essa política tem sua especificidade técnica e precisa ser respeitada”.
A presidenta do Conselho Regional de Serviço Social, Elisa Benedetto, esse desmonte que vem sendo feito pelo Governo do Estado viola os direitos das/os acolhidas/os, das/os trabalhadoras/es e fere autonomia das/os profissionais da FPE. “Essas vidas precisam ser cuidadas e protegidas pelo poder público. O Estado está tirando de si uma responsabilidade que é sua, prejudicando a assistência a essas pessoas”.
A audiência também contou com a participação de Ewelin Canizares e Patrícia Lisboa, do Conselho Estadual dos Direitos das Pessoas com Deficiência – COEPEDE; Clarice Böck, do Conselho Estadual da Saúde; Nelson Khalil, presidente do Conselho Municipal dos Direitos das Pessoas com Deficiência; Jucemara Beltrame, da Frente em Defesa do SUAS; da deputada estadual Luciana Genro (PSOL) e do deputado estadual Dr. Thiago Duarte (DEM). A secretária Regina Becker foi convidada a participar da audiência, mas não compareceu.