Na construção e adaptação de testes psicológicos para indivíduos com deficiência, faz-se imprescindível o atendimento aos pressupostos teóricos e técnicos inerentes ao processo de construção e adaptação de instrumentos sedimentados na literatura científica da área. Contudo, alguns aspectos adicionais devem ser observados com vistas à manutenção da qualidade psicométrica destes instrumentos:
1) Adaptar um teste para pessoas com deficiência não se resume em alterar um aspecto indistintamente sem avaliar as consequências na avaliação psicológica como um todo e nos resultados e procedimentos do próprio teste;
2) O uso de certos tipos de adaptações pode modificar o construto que está sendo medido. Cita-se como exemplo medidas de compreensão escrita e oral;
3) É condição indispensável, considerando a heterogeneidade da população com deficiência, o conhecimento profundo sobre o público ao qual o teste é destinado, o tipo de deficiência, e, como o público irá manusear os materiais do instrumento; e,
4) A equipe de desenvolvimento ou adaptação deve consultar indivíduos com as deficiências alvo para avaliar o impacto das adaptações realizadas em relação a aspectos de usabilidade, acessibilidade, clareza das tarefas, entre outros aspectos. Quando possível, a consulta a especialistas na área do construto ou a psicólogos que apresentam a deficiência para o qual o teste está sendo adaptado é recomendável.
No tocante à adaptação, ressalta-se ainda que quaisquer ajustes nos procedimentos padronizados dos testes e nos seus materiais assumem o risco de causar mudanças nas características dos instrumentos invalidando os resultados obtidos. Assim a eficiência de uma adaptação para indivíduos com deficiência só poderá ser comprovada por meio de estudos pela busca de indicadores de precisão e evidência de validade do teste adaptado. Dentre os métodos usados para verificar o efeito das adaptações em pessoas com e sem deficiência, tem grande relevância a investigação da ocorrência de função diferencial dos itens (DIF) (Oliveira, Nuernberg & Nunes, 2013; Psychological Testing Centre & The British Psychological Society, 2007; American Educational Research Association, American Psychological Association & National Council on Measurement in Education, 1999).
A construção e adaptação dos testes psicológicos para os indivíduos com deficiência configuram-se como atividades complexas que requerem, frequentemente, a utilização de várias modificações e alguns recursos adicionais, tais como as tecnologias assistidas, na tentativa de proporcionar acessibilidade aos materiais dos testes. Em auxílio aos desafios existentes neste processo de atendimento à diversidade humana, um recurso interessante é a aplicação do conceito de Desenho Universal.
Tal conceito busca proporcionar a máxima acessibilidade reduzindo o viés, pois permite pensar-se, desde o início da construção ou mesmo na pós-construção, em testes que possam ser flexíveis a acomodações atendendo a uma população ampla, incluindo pessoas com e sem deficiência. As adaptações realizadas fazem parte de estudos prévios e são utilizadas quando há necessidade ou quando compõem o teste, independentemente do indivíduo que as utilize. Muitas modificações utilizadas nos testes que aplicam o conceito de desenho universal, como as que aumentam a legibilidade e o fazer intuitivo e livre de complexidade desnecessária, produzem instrumentos de maior qualidade tanto para os indivíduos com deficiência quanto sem deficiência. Contudo a contribuição do desenho universal é mais evidente para os testes utilizados pelas pessoas com deficiência, pois o desenho universal permite que eles possam beneficiar-se dos instrumentos psicológicos de forma realmente inclusiva (Oliveira, Nuernberg & Nunes, 2013; Johnstone, 2003; Thompson, Johnstone & Thurlow, 2002).
Em síntese, não é recomendada qualquer adaptação sem prévio estudo. Nos casos em que o uso dos testes é inapropriado para as características individuais do avaliado, o psicólogo deverá proceder a avaliação com outros recursos reconhecidos pela Psicologia.
Referências:
American Educational Research Association, American Psychological Association, National Council on Measurement in Education (1999). Standards for educational and psychological testing. Washington, DC: Author.
Psychological Testing Centre & The British Psychological Society (2007). Visual impairment and psychometric testing: Practical advice for test users managing the testing of people who have signt disabilities. Recuperado em março de 2011, de www.psychtesting.org.uk.
Johnstone, C. J. (2003). Improving validity of large-scale tests: Universal design and student performance (Technical Report 37). Minneapolis, MN: University of Minnesota, National Center on Educational Outcomes. Retrieved. Recuperado em Agosto de 2011, de http://education.umn.edu/NCEO/OnlinePubs/Technical37.htm.
Thompson, S. J., Johnstone, C. J., & Thurlow, M. L. (2002). Universal design applied to large scale assessments (Synthesis Report 44). Minneapolis, MN: University of Minnesota, National Center on Educational Outcomes. Recuperado em Agosto de 2011, de http://www.cehd.umn.edu/nceo/onlinepubs/Synthesis44.html.
Oliveira, C. M. ; Nuernberg, A. H. & Nunes, C. H. S. S. (2013). A incorporação do Conceito de Desenho Universal na Avaliação Psicológica como promotora dos Direitos Humanos. Avaliação Psicológica (Impresso – Aceito para publicação).
Brasília, 31 de janeiro de 2013
Conselho Federal de Psicologia – CFP