O Conselho Federal de Psicologia (CFP), em conjunto com o Conselho Federal do Serviço Social e de outras entidades representativas dessas profissões, divulgaram nesta sexta-feira, 19/05, nota conjunta na qual defendem a imediata revogação do Novo Ensino Médio (NEM).
Para as entidades, a pretexto de oferecer opções aos estudantes por meio dos itinerários formativos, o Novo Ensino Médio retirou componentes curriculares importantes à formação da juventude, como os conteúdos de ciências humanas.
A nota também critica a expressiva redução da carga horária e aponta que a flexibilidade da grade curricular pode resultar na oferta de conteúdos irrelevantes, na contramão das instituições privadas, que poderão disponibilizar conteúdo que estudantes de escolas públicas não terão. “Na prática, aprofunda-se o abismo entre os sistemas público e privado e ceifam-se as chances e esperanças dos jovens da classe trabalhadora”.
Assinam a nota o Conselho Federal de Psicologia (CFP); o Conselho Federal de Serviço Social (CFESS); a Federação Nacional de Psicólogos (FENAPSI); a Associação Brasileira de Psicologia Escolar e Educacional (ABRAPEE); a Associação Brasileira de Ensino de Psicologia (ABEP); e a Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social (ABEPSS).
O Novo Ensino Médio
A Lei nº 13.415/2017 alterou a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional para modificar a estrutura do ensino médio, ampliando o tempo mínimo do estudante na escola de 800 horas para 1.000 horas anuais (até 2022) e definindo uma nova organização curricular que contemple uma Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e a oferta de diferentes possibilidades de escolhas aos estudantes.
Consulta pública
O Ministério da Educação instituiu, no mês de março, uma consulta pública para a avaliação e reestruturação da Política Nacional de Ensino Médio. A consulta ficará em curso até 6 de junho e terá a realização de audiências, oficinas de trabalho, seminários e pesquisas nacionais.
Leia abaixo a íntegra da nota conjunta ou acesse a versão em PDF
O que cabe à escola?
Cabe à escola a socialização e garantia de aprendizagem dos conhecimentos historicamente valorizados pela humanidade, na pluralidade de leituras de mundo. Cabe à escola a promoção de formação cidadã, na diversidade, a promoção de educação humanizada, para o respeito e a convivência cooperativa. Cabe à escola propiciar o acesso aos bens e artefatos culturais disponíveis nos territórios e para além deles, o que para muitos estudantes é a única chance de acesso a alguns espaços e experiências culturais. Cabe à escola, no contexto de desigualdade de nosso país, a construção da esperança.
O Ensino Médio em nosso país tem, além de seu dever de promover apropriação de conhecimentos, de competências, de transformação da consciência, a função potencial de garantir acesso ao ensino superior que, sabemos, representa não só realização de anseios e projetos, mas chance, para muitos, de melhoria de suas condições de vida – para si e para suas famílias. Políticas públicas instituídas nos anos 2000, como o sistema de cotas para as universidades públicas, o novo ENEM – que se tornou um caminho de acesso a essas universidades, trouxeram materialidade às esperanças de muitos jovens da classe trabalhadora, historicamente excluídos do ensino superior público, não por falta de mérito, mas de condições materiais de vida, que criam obstáculos e tornam injustos os processos de seleção uniformizados e falsamente neutros.
Nos últimos 4 anos, no entanto, jovens brasileiros de todo o país viram suas esperanças desvanecidas com a implantação do Novo Ensino Médio – proposto no Governo Temer e implementado no Governo Bolsonaro.
O Novo Ensino Médio, a pretexto de oferecer opções aos estudantes por meio dos itinerários formativos, na prática, retirou componentes curriculares importantes à formação da juventude, como os conteúdos de ciências humanas, bem como camuflou a histórica carência de docentes em algumas áreas – como química, física e biologia – uma vez que as escolas não são obrigadas a oferecer todas as opções de itinerário e disponibilizam aos seus estudantes aquelas que não apresentam carências de docentes. Além disso, há expressiva redução de carga horária, bem como uma flexibilidade que permite a oferta de conteúdos formativos irrelevantes para garantir acesso a boas universidades. Enquanto isso, as instituições privadas oferecerão carga horária sólida, formação disciplinar articulada e conteúdos com alguma profundidade, contraturnos para aprofundamento das disciplinas ministradas, podendo fornecer conteúdos que muitos alunos das escolas públicas não terão, acirrando a divisão de classe e a desigualdade de acesso aos conhecimentos científicos fundamentais para a formação humana.
Na prática, aprofunda-se o abismo entre os sistemas público e privado e ceifam-se as chances e esperanças dos jovens da classe trabalhadora. Se uma mão do governo concede mais financiamento para as universidades federais, aumento no valor de bolsas, a outra mão retira as chances de quem deveria receber do governo cuidados, oportunidades, respeito.
Estudantes, familiares, profissionais e pesquisadores da educação, no momento, clamam pela revogação do Novo Ensino Médio (NEM), sabedores e cientes de que em nada esse novo tem de novo, pois que excludente, e de que a formação da juventude restará empobrecida e esvaziada em seu sentido maior.
O NEM, do nosso ponto de vista, guarda coerência com um governo e Ministério da Educação passados que afirmavam que a universidade não era para todos, que professores demais atrapalham. Entendemos que, com o governo atual, a luta deve ser pela defesa dos direitos do povo trabalhador e com um MEC que leve em conta a preocupação da educação para todos.
Compreendemos que revogar o NEM não implicaria começar do zero, mas valorizar e resgatar a história em defesa de um Ensino Médio que promova o desenvolvimento de todas as pessoas. Antes desse projeto, já vínhamos discutindo a melhoria do ensino médio. A CONAPE de 2022 apresentou ao MEC um longo documento em que aponta críticas ao NEM, bem como alternativas para a formação no Ensino Médio. O Colégio Pedro II e os Institutos Federais são excelentes exemplos de Ensino Médio público de qualidade. Não partiremos do zero, mas de bons exemplos e boas práticas.
Como profissionais da Psicologia, do Serviço Social, da Educação, juntamo-nos às vozes de educadores, gestores educacionais, estudantes, pesquisadores e familiares para reivindicar a imediata revogação do Novo Ensino Médio.
Conselho Federal de Psicologia – CFP
Conselho Federal de Serviço Social – CFESS
Federação Nacional de Psicólogos – FENAPSI
Associação Brasileira de Psicologia Escolar e Educacional – ABRAPEE
Associação Brasileira de Ensino de Psicologia – ABEP
Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social – ABEPSS