Classificação indicativa, em vigor há três meses, evita a exposição de crianças a programas e filmes inadequados
Fonte: Correio Braziliense
Publicado em 10/07/2008
Foi uma longa batalha. Dezoito anos de luta para fazer cumprir o que determina o Estatuto da Criança e do Adolecente (ECA). Há três meses, em 7 de abril, finalmente venceram os defensores da classificação indicativa. Nessa data, entrou em vigor, plenamente, o texto da lei. Assim, emissoras de rádio e televisão, além de cinemas, ficaram obrigados a associar o horário de veiculação de um programa com o conteúdo exibido, evitando a exposição de meninos e meninas a cenas de sexo e violência, por exemplo. Programas classificados como inadequados para menores de 12 anos só podem passar após as 20h. Para menores de 14, o horário limite é 21h; e para quem tem até 16, 22h. Os programas para maiores de 18 anos só podem ser veiculados após as 23h.
"Dentro dessa recomendação, a principal vitória foi o respeito aos diferentes fusos horários existentes no país", ressalta Guilherme Canela, coordenador de relações acadêmicas da Agência de Notícias dos Direitos da Infância (Andi). No horário de verão, por exemplo, essa diferença aumentava em até três horas no Acre, que recentemente teve o fuso reduzido em uma hora. “Dessa forma, um filme de violência transmitido em Brasília às 23h, lá era exibido às 20h”, lembra Canela. "Os estados que não adotarem a mudança (de fuso) terão que ajustar suas grades de programação aos horários de Brasília", adianta o Secretário Nacional de Justiça, Romeu Tuma Júnior.
"Antes da edição da portaria, a gente vinha tratando essa questão no Acre na base de promoção de ações judiciais pontuais. Com a edição da portaria e a necessidade de vinculação da faixa etária ao horário de exibição do conteúdo, a situação ficou normalizada via gravação dos programas. E a mudança do fuso horário, sem dúvida, facilitou para as emissoras”, analisa o procurador-chefe da Procuradoria Regional da República no Acre, Marcus Vinícius Aguiar Macedo.
Temas educativos
A preocupação da administradora e cabeleireira Carolina Terzella Lariú, 31 anos, com o conteúdo a que seu filho, Leonardo Neris Lariú, 6, assiste na tevê antecede a nova classificação indicativa. "Sempre tive esse cuidado com ele. É um hábito que adquiri com meus pais. É importante que as crianças não pulem etapas enquanto não têm maturidade para entender, discriminar ou julgar a informação que recebem", defende a jovem mãe, que agora conta com o auxílio da classificação indicativa feita pelas próprias emissoras. "Ajudou bastante porque me dá um aparato. Se a classificação é livre, fico tranqüila. Mas dou preferência para os canais que priorizam temas educativos. Não gosto de desenhos com lutas, por exemplo", completa Carolina.
Ricardo Moretzsohn, psicólogo e representante do Conselho Federal de Psicologia na Campanha Quem Financia a Baixaria é Contra a Democracia, reconhece que é preciso um certo esforço dos pais e também disponibilidade para oferecer outras atividades lúdicas aos filhos em vez de deixá-los o tempo inteiro em frente à tevê. "Infelizmente, a maior parte dos conteúdos das emissoras brasileiras não contribui para a formação de valores positivos das nossas crianças. Mas, de forma alguma, eu defendo que as crianças sejam colocadas numa redoma e vejam o mundo cor-de-rosa. Por isso, é fundamental a presença de um adulto ao lado delas para conversar e explicar o que é transmitido. Acredito que, eventualmente, elas possam assistir a uma cena de sexo ou de violência. Mas é preciso que encontrem um significado para o que viram. E a responsabilidade sobre isso é dos pais", reforça Ricardo.
Guilherme Canela concorda que, em última instância, caberá aos pais a decisão sobre quais programas os filhos poderão assistir, desde que estejam presentes para participar dessa orientação. "Isso vai depender do nível de instrução da família, de sua cultura e do que ela considera importante ou não para aquela faixa etária. Mas não podemos ser ingênuos de acreditar que a maioria dos pais estará em casa. Portanto, a questão da vinculação da faixa etária ao horário é a política do empoderamento das famílias", avalia.
Por parte das emissoras, a medida não é vista com bons olhos. Questiona-se, por exemplo, sobre até que ponto o conteúdo televisivo é capaz de influenciar na formação das crianças. "Somos a favor da classificação indicativa, desde que ela seja meramente indicativa", argumenta o presidente da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), Daniel Slaviero.