Estudos sobre a "base biológica para a violência em menores infratores": novas máscaras para velhas práticas de extermínio e exclusão.
É com tristeza e preocupação que recebemos a notícia de que Universidades de grande visibilidade na vida acadêmica brasileira estão destinando recursos e investimentos para velhas práticas de exclusão e de extermínio. A notícia de que a PUC-RS e a UFRGS vão realizar estudos e mapeamentos de ressonância magnética no cérebro de 50 adolescentes infratores para analisar aspectos neurológicos que seriam causadores de suas práticas de infração nos remete às mais arcaicas e retrógradas práticas eugenistas do início do século XX.
Privilegiar aspectos biológicos para a compreensão dos atos infracionais dos adolescentes em detrimento de análises que levem em conta os jogos de poder-saber que se constituem na complexa realidade brasileira e que provocam tais fenômenos, é ratificar sob o agasalho da ciência que os adolescentes são o princípio, o meio e o fim do problema, identificando-os seja como "inimigo interno" seja como "perigo biológico", desconhecendo toda a luta pelos direitos das crianças e dos adolescentes, que culminou na aprovação da legislação em vigor - o Estatuto da Criança e do Adolescente.
Pensar o fenômeno da violência no Brasil de hoje é construir um pensamento complexo, que leve em consideração as Redes que são cada vez mais fragmentadas, o medo do futuro cada vez mais concreto e a ausência de instituições que de fato construam alianças com as populações mais excluídas. É falar da corrupção que produz morte e isolamento e da precariedade das políticas públicas, sejam elas as políticas sociais básicas como educação e saúde, sejam elas as medidas sócio-educativas ou de proteção especial.
Enquanto a Universidade se colocar como um ente externo que apenas fragmenta, analisa e estuda este real, sem entender e analisar suas reais implicações na produção desta realidade, a porta continuará aberta para a disseminação de práticas excludentes, de realidades genocidas, de estudos que mantêm as coisas como estão.
Violência não é apenas o cometimento do ato infracional do adolescente, mas também todas aquelas ações que disseminam perspectivas e práticas que reforçam a exclusão, o medo, a morte.
Triste universidade esta que ainda se mobiliza para este tipo de estudo, esquecendo-se que a Proteção Integral que embasa o ECA compreende a criança e o adolescente não apenas como "sujeito de direitos" mas também como "pessoa em desenvolvimento" - o que por si já é suficiente para não engessar o adolescente em uma identidade qualquer, seja ela de "violento" ou "incorrigível".
A universidade brasileira pode desejar um outro futuro: o de estar à altura de nossas crianças e adolescentes.
Assinam a Nota:
1. Ana Maria Falcão de Aragão Sadalla - Departamento de Psicologia Educacional Faculdade de Educação Universidade Estadual de Campinas;
2. Angel Pino - psicólogo e criminólogo, professor da Unicamp;
3. Antonio Carlos Amorim - Faculdade de Educação/Unicamp;
4. Antonio Miguel - Professor da FE-UNICAMP;
5. Associação Excola;
6. Áurea M. Guimarães - F.E. – Unicamp;
7. Carlos Eduardo Albuquerque Miranda - Professor da FE – UNICAMP;
8. Carlos Eduardo Millen Grosso - Mestre em História pela PUC-RS;
9. Carmen Lucia Soares- Professora da FE e FEF-UNICAMP;
10. Centro Internacional de Estudos e Pesquisas sobre a Infância - CIESPI;
11. Childhope Brasil- Dayse Tozzato (Diretora-Presidente);
12. Comissão de Direitos Humanos do Conselho Regional de Psicologia do Rio de Janeiro – CDH/CRP-05;
13. Comissão de Direitos Humanos do CRP 06 (São Paulo);
14. Comissão Nacional de Direitos Humanos do Conselho Federal de Psicologia – CNDH/CFP;
15. Cristina Rauter – Professora da Universidade Federal Fluminense / UFF;
16. Curso de Especialização em Psicologia Jurídica da Universidade do Estado do Rio de Janeiro/ UERJ;
17. Daniel Damiani - 1° Diretor de Assistência Estudantil da UNE;
18. Dario Fiorentini - Professor da FE-UNICAMP;
19. Des. Siro Darlan de Oliveira – Presidente do CEDCA/RJ;
20.Edgard de Assis Carvalho- Professor; Coordenador do Núcleo de Estudos da Complexidade da PUC/SP;
21. Ezequiel Theodoro da Silva – Unicamp;
22. Fernanda Rodrigues da Guia - Acadêmica de Psicologia da UFF -Estagiária da Secretaria de Administração Penitenciária do Rio de
Janeiro;
23. Gaudêncio Frigotto – Professor do Programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. PPFH/UERJ;
24. Grupo Atitude! Protagonismo Juvenil;
25. Helena Costa Lopes de Freitas - Profa. Aposentada UNICAMP;
26. Heloísa Helena Pimenta Rocha FE-UNICAMP;
27. Janne Calhau Mourão – Psicóloga – Projeto Clínico-Grupal TNM- RJ;
28. Jeferson Pereira, ONG Orselit – Porto Alegre;
29. José Claudinei Lombardi - Professor da FE UNICAMP; Coordenador do Grupo de Estudos e Pesquisas HISTEDBR;
30. Késia D’Almeida – Pedagoga da Creche da Fundação Oswaldo Cruz;
31. Klelia Canabrava Aleixo. Professora da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais;
32. Lenir Nascimento da Silva – Pediatra da Creche da Fundação Oswaldo Cruz/FIOCRUZ;
33. Luci Banks Leite-Professora FE-UNICAMP;
34. Luciene Naiff – UNIVERSO;
35. Luís Gustavo Franco, advogado e professor de Direito da Criança e do Adolescente da UNDB - São Luís/MA;
36. Luiz Fernandes de Oliveira - CAp UERJ, FAETEC e PUC-Rio;
37. Lygia Santa Maria Ayres - psicóloga, pesquisadora da UFF e conselheira presidente da Comissão de Orientação e Etica do CRP RJ;
38. Marcelo Cafrune, advogado, mestrando em Direito na UFSC;
39. Marcelo Dalla Vecchia - Professor da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS);
40. Márcia Badaró – Conselheira do Conselho Regional de Psicologia do Rio de Janeiro (CRP-05);
41. Margareth Silva Rodrigues Alves – Historiadora - Diretora do Arquivo Histórico da Câmara Municipal de Cabo Frio – Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. PPFH/UERJ;
42. Maria da Conceição Xavier de Almeida- Professora; Coordenadora do Grupo de Estudos da Complexidade da UFRN;
43. Maria das Graças de Carvalho Henriques Áspera – Psicóloga da FUNDAC – Fundação da Criança e do Adolescente (Bahia);
44. Maria Helena Salgado Bagnato;
45. Maria Helena Zamora - Professora da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro / PUC-Rio;
46. Marília Denardin Budó - RG 1063484909 - Mestrado em Direito - UFSC
Isis de Jesus Garcia - Mestranda UFSC Direito;
47. Mônica Lins – Colégio de Aplicação da UERJ;
48. Nuances – grupo pela livre expressão sexual – Porto Alegre;
49. Núcleo de Pesquisas Políticias que produzem educação (NUPE) da UERJ
50. Patrícia Trópia Professora da PUC-Campinas;
51. Pedro Paulo Gastalho de Bicalho – Vice-presidente do Conselho Regional de Psicologia do Rio de Janeiro (CRP-05) e professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro/ UFRJ;
52. Programa Cidadania e Direitos Humanos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro - PCDH/UERJ;
53. Programa Pró-Adolescente da Universidade do Estado do Rio de Janeiro/ UERJ;
54. Rafael L. F. da C. Schincariol - mestrando em direito pela UFSC;
55. Raquel de Almeida Moraes - Doutora em Educação pela Unicamp - Professora da Universidade de Brasília - Programa de Pós-Graduação em Educação;
56. Regina Maria Bastos Ferreira - Professora da Universidade Comunitária Regional de Chapecó/SC;
57. Regina Maria de Souza - docente da Faculdade de Educação da UNICAMP;
58. Rita de Cássia Fagundes - Educadora - Agente Jovem - Cascavel/PR;
59. Simone Brandão Souza – Coordenação de Serviço Social – SEAP – RJ;
60. Tatiana Machado – Marcha Mundial de Mulheres;
61. Themis – Assessoria Jurídica e Estudos de Gênero – Porto Alegre.
62. Conselho Regional de Psicologia do RS