Na noite de terça-feira, 11/05, às 19h, o CRPRS realizou a reunião “Psicologia, Abolicionismo Penal e Luta pelo Desencarceramento” que foi aberta à categoria e contou, ainda, com a participação do Pe. Edson André Cunha Thomassim, militante da Pastoral Carcerária, desde 1996, e graduado em Filosofia e Teologia.
Durante a conversa, foram discutidos três principais pontos: o primeiro é que, no Brasil, a misoginia, o racismo e a desigualdade social estão enraizados nos processos de encarceramento em massa; o segundo, critica a ideia de funcionamento dos espaços penitenciários, que, historicamente, são estruturados com uma lógica de conflito e não de restauração; já o terceiro ponto questiona de que forma essas realidades ecoam no fazer profissional da Psicologia.
Para o Pe. Edson, que é, também, pós-graduado em Adolescência e Juventude no Mundo Contemporâneo pela CAJU- Go/FAJE-MG, é importante fazer uma análise e diferenciação entre a vida de uma pessoa branca de classe média, que nasce com oportunidades e acesso à educação com a vida daquela criança negra e periférica, que se encontra em uma situação de extrema vulnerabilidade social e enfrenta, ainda, muitos conflitos nos processos educacionais.
Segundo o convidado, é muito comum encontrar histórias de jovens que viviam na extrema pobreza e tiveram que abandonar seus estudos, porque precisavam de dinheiro. Estes, muitas vezes, quando chegam ao mercado de trabalho, em busca de uma oportunidade, são barrados, ou por questões raciais, da própria escolaridade ou por morarem em locais considerados “marginalizados”. “Na maior parte desses casos, as/os adolescentes que não conseguem se encaixar nos espaços escolares, nem são aceitos no mercado de trabalho, acabam por ser acolhidos somente pelos traficantes dos seus bairros.”, lamentou o padre uma atual realidade que presencia nos presídios. “Essa real situação pode ser observada, também, nos baixos índices de escolaridades dos presos do sistema prisional.”
“Quando essa/e adolescente comete um crime e chega às Unidades Socioeducativas, o modelo de tratamento que esses espaços oferecem é o mesmo das outras cadeias: de violência e coerção.”, comentou, ao lembrar que o jovem não consegue se desenvolver individualmente, em um ambiente necessariamente massivo.
No campo filosófico tradicional, o paradigma da liberdade é considerado ontológico, ou seja, está na essência do ser humano e, para o Pe. Edison, se uma/um adolescente está privada/o de algo da sua essência, ela/e não vai conseguir ter condições de construir um imaginário ético necessário para viver em sociedade. “Por isso, quando é tirada/o de lá, acaba voltando para o único universo que lhe abrigou: o da criminalidade. A mesma coisa acontece com as estruturas das facções: quanto mais você tenta combatê-las com o encarceramento em massa, maior elas se tornarão, porque se retroalimentam.”
“Ninguém sai saudável e nem emocionalmente equilibrado do sistema prisional. Nenhuma pessoa se liberta de determinada conduta ou realmente paga sua pena, se ela não for trabalhada naquilo.”, comentou.
No decorrer de sua fala, Pe Edson concluiu que somente as políticas de rede podem interferir nessas realidades. “À medida que eu quero desencarcerar, eu preciso fortalecer a presença da comunidade, do Estado e de ações de políticas públicas consultoras de paz e mediadoras de conflito em territórios caracterizados como violentos.”
A crítica da teoria criminológica do abolicionismo penal entende que a privação da liberdade tem causado mais danos que resoluções aos conflitos sociais. Nesse sentido, para a Psicologia, esses danos se estendem para outros campos além da atuação no sistema prisional. Segundo a mediadora do evento, Maynar Vorga, conselheira do CRPRS e trabalhadora do sistema prisional gaúcho, o aprisionamento penal não é diferente do aprisionamento manicomial, pois, ambos atuam com as mesmas perspectivas de segregação.
A vice-presidenta do Conselho e presidenta da Comissão de Direitos Humanos, Cristina Schwarz, também participante da reunião, alertou que, atualmente, a segregação, o confinamento e os dispositivos manicomiais ainda são práticas presentes em comunidades terapêuticas, inclusive, estão sendo investidas como soluções para tratamentos de alcoolismo e dependência química. “Por esse motivo, o CRPRS considera que é indispensável construir subsídios para que a Psicologia também se reconheça como agente na luta contra o encarceramento em massa e atue, em diferentes contextos, para desconstruir o raciocínio de segregação que permeia nosso imaginário social e as práticas cotidianas.”
A atividade aconteceu por meio de inscrição prévia e possibilitou que as/os participantes pudessem abrir seus microfones para fazer perguntas e/ou reflexões.
Assista a reunião na íntegra: