A Articulação Nacional de Psicológas/os/ues Negras/os/es e Pesquisadoras/es (ANPSINEP), em seus doze anos de existência, realizou duas campanhas nacionais focadas na defesa da vida e da saúde mental da população negra. A partir das nossas campanhas, lembramos que o racismo persiste no imaginário, nas práticas institucionais e nas relações interpessoais, afetando o funcionamento da sociedade e a construção das subjetividades.
Na primeira campanha, chamamos atenção para o debate sobre a saúde mental da população negra com o tema "Saúde Mental da População Negra IMPORTA!". Na segunda campanha, conscientes de que a saúde mental depende objetivamente de um corpo vivo e saudável, focamos na importância da vida da juventude negra que tem sido ceifada pela política de guerra e extermínio. O tema da campanha foi “A Juventude Negra, quer Viver, Sonhar, Estudar, Planejar..!”.
Em 2022, num ano de tantos desafios e lutas em defesa das instituições democráticas, escolhemos lançar nossa campanha num momento em que é possível esperançar, sem perder de vista a defesa incansável de nossas existências, de nossa ancestralidade e do nosso bem viver. Lembramos que o tema das relações raciais pavimentou o desenvolvimento do pensamento psicológico brasileiro, em especial por meio dos estudos da psicanalista e pesquisadora Virgínia Leone Bicudo, mulher negra, pioneira em muitos aspectos, fundadora do Conselho Federal de Psicologia. Entretanto, os avanços em nossa profissão no que toca o enfrentamento do racismo, começaram a ocorrer somente em 2002, após a aprovação da Resolução do Conselho Federal de Psicologia nº 018/2002.
Por esta razão, hoje, no encerramento do 6º Congresso Brasileiro de Psicologia: Ciência e Profissão, realizado no mês da consciência negra, mais uma vez reforçamos nosso manifesto em defesa da democracia e da saúde mental sem racismo, pelo bem viver. O Brasil só será um país democrático quando as injustiças e iniquidades sociais provocadas pelo racismo forem superadas! Não há democracia sem justiça social.
A Psicologia tem um papel fundamental no enfrentamento do racismo e da democracia. A população negra não só representa 56% da população brasileira, como é também maioria nos serviços do SUAS e do SUS. O desmonte das políticas públicas de Saúde e Assistência Social, somado ao avanço da necropolítica, representam a intensificação da marginalização e da violência histórica que recaem sobre pessoas negras. Portanto, psicólogas e psicólogos, onde quer que atuem, não podem silenciar diante da ameaça às instituições, das violências e das iniquidades sociais.
Sabemos que a instabilidade da democracia impacta de maneira diferente homens e mulheres, negros e brancos. Enquanto homens brancos se mantém seguros no topo das estruturas sociais e políticas, mulheres negras, cis e trans, ocupam a base, são massacradas ao menor sinal de desmonte de serviços públicos e de recessão econômica. A onda crescente de ataques à democracia brasileira tem sido acompanhada dos ataques violentos aos corpos negros, indígenas, mulheres trans e travestis, aos corpos periféricos. Amarildo, Genivaldo, Cláudia, Miguel, Marielle, não são números frios, são nomes com sobrenomes, são pais, mães, filhos, irmãos, tios, amigos, profissionais, vidas assassinadas.
Diante do estado de violências e do impedimento do direito à vida com dignidade, reafirmamos a urgência de superação das desigualdades no exercício da democracia, que tem sido um privilégio de poucos para poucos. Pautamos e reivindicamos o avesso disso: uma democracia plural, diversa, exercida por muitas vozes e corpos que seguem construindo e sustentando esse país. Vozes mulheres negras, periféricas, nordestinas, travestis e transsexuais.
Nosso esperançar caminha lado a lado com o direito de existir em muitas dimensões, social e politicamente. Somos mais que um dado ou um recorte de raça. Somos trabalho, assistência social, economia, previdência, meio ambiente. Queremos mais que uma participação política reduzida à raça. Queremos existir e participar das decisões políticas desse país. Queremos respeito e dignidade. Queremos bem viver! A Psicologia por meio do seu ecossistema de entidades e pessoas deve assumir o compromisso efetivo com a defesa do bem viver.
É preciso um compromisso ético e antirracista em atitude, para além do discurso. O país será verdadeiramente democrático quando não houver mais fome e miséria, quando o racismo não for uma constante em nossas vidas, quando jovens negros deixarem de ser assassinados pela violência policial, quando as crianças negras, como o menino Miguel, não forem mortas pelas patroas que não as enxergam dignas de serem cuidadas e protegidas, quando mulheres negras estiverem representadas nas diversas áreas políticas, da economia à saúde. Por isso, defendemos radicalmente o Estado democrático sem racismo, plural, diverso e pelo nosso bem viver.
Convidamos você a se engajar conosco nesta campanha dialogando e aprofundando neste caminho para conquistarmos uma sociedade equânime e que considere os saberes ancestrais, a história da população negra que ainda é invisibilizada e/ou interrompida, histórias estas que constituem a nossa sociedade.
A Campanha “Democracia e Saúde Mental sem Racismo: Queremos Bem Viver!” será veiculada durante o ano de 2023, por meio das redes sociais e dos veículos de comunicação. Esse é um chamado a todos os setores da sociedade brasileira para fazer adesão.
O CRPRS junta-se à ANPSINEP e a outras organizações nesse movimento! Assine o manifesto e faça a adesão à campanha!
Utilize as hashtags: #queremosbemviver #democraciasemracismo #saudementalsemracismo #saudementaldapopulacaonegra