O Conselho Federal de Psicologia (CFP) defendeu, mais uma vez, sua posição contrária ao projeto Depoimento Sem Dano. A manifestação foi feita, durante o Seminário Nacional "Precarização da Formação e Implicações no Exercício Profissional", promovido pelo Conselho Federal de Serviço Social (CFESS), realizado em Brasília, nos dias 12 e 13 de junho.
O próximo debate acerca do tema acontece no dia 24, às 14h, em audiência pública no Senado, para tratar da implantação desse sistema em todo o Brasil, cuja lei (PLC 35/07) está sob apreciação da Casa.
O Depoimento Sem Dano foi criado em 2003, no Juizado da Infância e Juventude de Porto Alegre, e é destinado à oitiva de crianças e adolescentes apontados como vítimas ou testemunhas de abuso sexual ou maus-tratos.
A integrante da Comissão de Direitos Humanos do CFP Fernanda Otoni argumentou que o Judiciário precisa encontrar outros meios para produzir as provas contra o suposto agressor. "O psicólogo não é psicólogo quando realiza uma inquirição em substituiçao ao juiz. Essa não é uma prática psicológica, porque o profissional está colhendo o depoimento orientado por um juiz. O objetivo é a extração da verdade para formalizar o andamento do processo", afirmou Fernanda. "A criança tem o tempo dela e isso precisa ser respeitado. Devemos garantir a ela o direito de falar ou não. Estamos discutindo aqui o carater compulsório do projeto. Se a criança desejar falar sobre isto ao juiz, ela pode fazer diante dele mesmo. Não é preciso que o magistrado se transvista de psicólogo ou assistente social", completou.
Além do CFP, a Mesa "Posições Polêmicas sobre a Metodologia do Depoimento Sem Danos" contou com a participação do juiz José Antônio Daltoé, precursor do método no Rio Grande do Sul. Cada um dos palestrantes teve 50 minutos para expor seus argumentos acerca do tema. Depois, eles foram sabatinados pelos participantes do seminário. "Os psicólogos e assistentes sociais que trabalham no programa têm autonomia para filtrar as perguntas do juiz, promotor e advogados. Nós oferecemos inclusive a oportunidade da vítima ser inquirida na sala de audiência comum. Mas elas não querem ser ouvidas naquela sala, preferem ir à sala com as assistentes sociais. Depois, algumas procuram conhecer o juiz", justificou o magistrado.
Violaçao de direitos
Diante da afirmação de que as crianças negavam-se a participar da oitiva na frente de um juiz, Fernanda ficou temerosa. "Se elas não querem ser ouvidas na sala do juiz e preferem a sala dos técnicos, e vocês filmam e assistem ao depoimento dela; vejo aí a vontade da criança de não ser ouvida desconsiderada", retrucou a integrante da Comissão Nacional de Direitos Humanos, no fim do debate. "Os psicólogos e assistentes sociais podem participar do processo judicial ocupados em ofertar o seu trabalho ao lado da autoridade judicial, visando sempre o interesse da criança, a restauração dos laços sociais, a saúde mental, a convivência familiar, a elaboraçao de conflitos, como prevê o ECA. E não como inquiridores, estudiosos das mais recentes metodologias de investigação policial, contribuindo com esse espetáculo da criminalizaçao", completou Fernanda, diante dos cerca de cem presentes ao evento.
O CFESS convidou o CFP para participar do encontro a fim de informar à categoria sobre os riscos e as fragilidades que o programa Depoimento Sem Dano apresenta. Os assistentes sociais ainda não deliberaram a respeito do tema. Segundo a conselheira federal de serviço social Marylucia Mesquita, o apoio ou não ao programa será oficializado no encontro nacional da categoria, previsto para setembro.
Fonte: Conselho Federal de Psicologia