Na noite de terça-feira, 16/08, o CRPRS promoveu evento alusivo ao Dia da/o Psicóloga/o, marcando os 60 anos da regulamentação da Psicologia no Brasil. O evento “60 anos da Psicologia: produzir e resgatar histórias para construir o futuro que queremos!” foi transmitido on-line pelo Canal do CRPRS no YouTube e acompanhado por instituições de ensino de todo o país e Polos do CRPRS. Antecedendo as falas das psicólogas convidadas, foi exibido um vídeo institucional produzido pelo Conselho Federal de Psicologia sobre os 60 anos da profissão.
A presidenta do CRPRS, Ana Luiza de Souza Castro (CRP 07/03718), responsável pela condução da mesa, destacou, na abertura do evento, o contexto em que a Psicologia comemora esse marco. “Vivemos uma grande crise social no país, estamos em meio ao desmonte das políticas públicas e ao aumento assustador de crimes de ódio, como racismo, feminicídio e a volta dos manicômios. Grandes valores da Psicologia estão sofrendo ataques”.
Céu Silva Cavalcanti (CRP 05/57816), psicóloga clínica e doutoranda em Psicologia pela UFRJ, conselheira do CRPRS, integrante da diretoria nacional da Associação Brasileira de Psicologia Social (Abrapso) e da Articulação Nacional de Psicologues Trans (ANP Trans) e membro do conselho consultivo da Associação Brasileira de Estudos da Trans-Homocultura (ABETH), fez um resgate citando o lado complexo e controverso da história, marcado por disputas, ruídos e sutilezas importantes para compreendermos a Psicologia que temos hoje e o futuro que buscamos. “É preciso resgatar essas histórias para compor futuros, pensar de tudo o que herdamos o que queremos passar adiante. A Psicologia oferece diversas ferramentas. Mais do que entender qual usar, devemos nos perguntar sobre seus efeitos”.
Para Céu, a Psicologia que no passado foi utilizada para definir conceitos de periculosidade e de quem é o sujeito perigoso, por exemplo, ainda produz efeitos hoje em nossa sociedade, marcando uma segregação e reafirmando violências históricas. “Sabemos que, nesse imaginário, o perigoso tem raça, cor, classe”. Para a psicóloga, é preciso resgatar histórias, um passado que ainda tem seus efeitos e que precisamos dar conta, para pensar no futuro. “Que modelo de Psicologia queremos? Vamos retomar uma lógica manicomial, da correção, da ordem da vigilância ou queremos apostar numa Psicologia de garantia de direitos, que luta para garantir uma vida cada vez mais digna para a população e entende que isso é cuidado?”, questionou a convidada ressaltando a importância de apostar em modos de produção de subjetividades que deem conta das diferenças.
Maria Luiza Pereira de Oliveira (CRP 07/04234), doutoranda em Psicologia Social e Institucional, psicóloga clínica e psicóloga hospitalar do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, integrante do Coletivo Adinkra e da Articulação Nacional de Psicólogas(os) e Pesquisadoras(es) de Relações Raciais e Subjetividades – ANPSINEP, resgatou sua história pessoal, de fetos e experiências, mostrando de que forma essas vivências contribuíram para sua trajetória na Psicologia. “O início de minha vida profissional é marcado pela observação de como operam as relações de poder e as relações sociais, que são marcadas por desigualdade e discriminação, O desejo de aquisição de conhecimento me leva a buscar autores para além da teoria clínica, repensar paradigmas. A aproximação da Psicologia com o tema das Relações Raciais, no início dos anos 2000, mudou minha percepção de participação na sociedade e no ativismo como mulher negra”, narrou Maria Luiza. Diante disso, para o futuro, sua aposta é no conhecimento.
Dando sequência a essa reflexão, Sandra Fagundes (CRP 07/1644), psicóloga, psicanalista, mestre em Educação, professora convidada da Residência Integrada de Saúde Mental Coletiva da UFRGS e do Mestrado em Saúde Mental da Universidade Nacional de Córdoba, Argentina, analisou a contribuição da Psicologia para o processo democrático. “A Psicologia deve ser híbrida, transdisciplinar. Minha aposta é numa maior porosidade e na ampliação da possibilidade de diálogo com outras disciplinas para propor espaços de transformação em nossa sociedade. Sinto falta de psicólogas/os elaboradoras/es de políticas públicas, que possam refletir sobre que sociedade podemos construir a partir do que conhecimentos”, avaliou reforçando a importância de dispositivos democráticos como os do Controle Social e dos movimentos sociais. “Precisamos abrir espaços, mostrar que é possível uma clínica emancipatória. Para isso, precisamos de políticas públicas efetivas, fortes, de contratos e vínculos de trabalho que garantam o desenvolvimento de projetos terapêuticos potentes. É fundamental e urgente mudar a condução dos governos executivos no Brasil e trabalhar na promoção de movimentos e potências para invenção de novos cuidados e lutas”.
Thaíse Mendes Farias (CRP 07/28216), psicóloga clínica, mestre em Ciência Política, doutoranda em Psicologia Clínica, coordenadora do Núcleo de Processos Clínicos e Psicossociais da Subsede Sul do CRPRS, destacou a importância de se trabalhar pelo fortalecimento de uma Psicologia comprometida com a ciência e coletiva. Thaíse lembrou que, ao longo da história da profissão, a pessoas negras passaram de objeto de estudo a protagonistas, passando a ocupar espaços de poder e de produção de conhecimento. “Para ter uma escuta qualificada, o psicoterapeuta precisa ter habilidades multiculturais. Assim, estarão atentos a microviolências cotidianas, sutis e inconscientes, que atingem mulheres, negros, pessoas LGBTQIA+, refugiados, e lutarão contra práticas baseadas em pseudociências que são adoecedoras e excludentes e que criminalizam o sofrimento”. O desmonte das políticas de investimento na ciência foi criticado por Thaise que aposta na Educação para o futuro. “Nossa profissão precisa deixar de ser solitária, precisamos unir experiências, pensar em modelos que não sejam eurocentrados, em outras formas de intervenção que deem conta da nossa realidade, do que estamos vivendo. Precisamos de um modelo coletivo, em que possamos compartilhar saberes e afetos, e que a gente resista, cada vez mais!”.
Saiba mais sobre as homenagens à Psicologia que estão sendo feitas pelo estado acessando crprs.org.br/60anos.