O tema “Psicologia Crítica do Trabalho” foi desenvolvido em três diferentes aspectos na noite desta quarta-feira, 21/10, no auditório do CRPRS, como evento preparatório ao Seminário Psicologia Crítica do Trabalho, a ser realizado dias 06 e 07 de novembro em Belo Horizonte, numa promoção do CFP. O primeiro eixo “O trabalho do profissional psicólogo, construindo uma posição crítica”, ficou a cargo de Denise Macedo Ziliotto; o segundo, “Saúde do trabalhador: dignidade, qualidade de vida no mundo do trabalho”, teve como palestrante Maria da Graça Jacques; e o terceiro tema, “Crise, trabalho e sociedade: economia solidária como perspectiva para humanidade” foi desenvolvido por Karen Eidelwein. Promoção conjunta do CRPRS e do Sindicato dos Psicólogos do RS, o encontro reuniu na platéia profissionais e estudantes de psicologia.
A palestrante Denise Macedo Zilliotto, abrindo os trabalhos, lembrou que em função dos enormes avanços tecnológicos e de outras mudanças de caráter econômico, “os conceitos tradicionais de trabalho já não dão conta da realidade, embora as novas configurações ainda sejam frágeis”. Neste terreno que apenas começa a ser observado com olhar crítico, ela acredita que é fundamental reposicionar a psicologia do trabalho nos dias de hoje.
Dimensão política
Disse que na formação acadêmica ainda predomina uma visão utilitarista do tema, e que tentativas de aprofundamento teórico da questão sofrem resistências – muitas vezes dos próprios estudantes. Denise defendeu que os psicólogos devem ousar e tentar modificar as estruturas profissionais em que estão inseridos. Para ela, é essencial resgatar a dimensão política da psicologia do trabalho.
A professora Graça Jacques, em sua palestra, lembrou notícia recente sofre uma série de suicídios de funcionários da empresa France Telecom, que teriam sido causados pelo excessivo rigor da companhia nas exigências de trabalho, entre outros fatores. Graça citou ainda fenômeno semelhante ocorrido no Brasil, especialmente na década de 90, quando houve a reformulação do sistema bancário brasileiro, com fusões e outras medidas de interesse do grande capital que desempregaram e levaram ao desespero milhares de pessoas.
“São fatores mundiais, que vão além da questão do sofrimento psíquico e tem outras raízes”, disse. Ela historiou a evolução da psicologia do trabalho através dos séculos 19 e 20 e citou o tempo em que o trabalhador que não se adaptava – por questões salariais, por exemplo – era denominado “neurótico” e encaminhado à tratamento psiquiátrico.
Nexo causal
“Temos hoje a psicologia social do trabalho, que não é psicologia aplicada, mas crítica”, definiu. “Precisamos compreender o trabalho como elemento constitutivo da subjetividade e do processo saúde/doença mental”. Citou o caso de um funcionário, humilhado pela chefia, que não conseguiu responder e ficou mudo. “Ora, aqui entra nosso espírito crítico e objetivo – se diagnosticarmos o quadro desse rapaz como histeria, ele não terá direito ao auxílio-desemprego...”, exemplificou Graça Jacques. “Bem ou mal, como psicólogos do trabalho com visão crítica, temos que agir com nexo causal, pois é assim que a legislação atua”.
Karen Eidelwein, na abordagem sobre economia solidária – tema de seu doutorado, recém concluído – recordou que essa alternativa de geração de trabalho e renda ganhou novo impulso a partir dos ano 90, quando a ascensão do neoliberalismo deu início ao fechamento de postos formais de emprego. “Hoje estes princípios estão espalhados por organizações como cooperativas de produção, bancos comunitários, redes de empreendimentos, clubes de trocas solidárias, agroindústrias familiares e outras”, destacou, “não envolvendo apenas coletivos de desempregados ou em situação de vulnerabilidade”.
Política pública
No panorama atual, disse Karen, todos somos livres para trabalhar ou não, para escolher o que queremos fazer, mas não temos direito ao trabalho. Neste sentido, ela vê como positivo o esforço para colocar a economia solidária como uma política pública, ao lado de outros temas fundamentais. “No mínimo isso poderá dar sustentação financeira para essas redes e organizações solidárias, embora haja o risco de serem capturadas pelas grandes estruturas”, alertou. E a psicologia nesse contexto? “Temos que ter na psicologia uma leitura ampla, englobando o que acontece no mundo do trabalho, as relações e as condições em que isto acontece”.
A palestrante propõe que a psicologia do trabalho valorize princípios da própria economia solidária, como a produção da saúde de modo geral; a atuação em equipe interdisciplinar; e as estratégias de fortalecimento dos coletivos, visando uma modificação social”.
As colocações das palestrantes suscitaram várias questões dos presentes. A psicóloga Clarice Moreira, vice-presidente do CRPRS, defendeu que a psicologia organizacional incorpore esta visão crítica, e fez uma crítica à falta de aprendizagem sobre leis trabalhistas, no contexto da formação dos psicólogos.
José Antônio Silva