RECOMENDAÇÃO CONJUNTA Nº 01/2020
Os Conselhos de Direitos Humanos por meio da Rede nacional de Conselhos de Direitos Humanos recomendam medidas a respeito da pandemia Covid-19 para várias autoridades dos diversos poderes e à população em geral.
A Rede Nacional de Conselhos de Direitos Humanos que reúne Conselhos de Direitos Humanos de todo o Brasil, pelos Conselhos signatários tendo em conta o Pacto Nacional de Conselhos de Direitos Humanos, por estes assinado, e diante das orientações das autoridades de saúde internacionais, nacionais e estaduais, diante da manifestação de preocupações sobre os mais diversos temas e por sua responsabilidade legal de acompanhamento das medidas tomadas pelas autoridades e de monitorar a vigência dos direitos humanos nos encaminhamentos que forem sendo feitos.
CONSIDERANDO que a vida de todas e todos, sem condicionalidades, está na base de todo valor e de todos os direitos e que sua proteção não pode ser relativizada por razões fiscais, orçamentárias, ou mesmo por interesse de qualquer tipo, particularmente aqueles de lucro;
CONSIDERANDO a necessidade de conter o contágio do vírus “Covid-19”, cuja disseminação já foi declarada como pandemia pela Organização Mundial da Saúde (OMS), o que significa o risco de atingir de forma simultânea a população mundial, com cada vez mais baixa possibilidade de rastreamento e identificação, dada a massificação;
CONSIDERANDO a urgência em reduzir a velocidade de transmissão, para que o sistema de saúde tenha condições de atender aos infectados/as e que o acesso ao tratamento não seja prejudicado, inclusive considerando as diversas medidas já adotadas pelas autoridades de saúde pública;
CONSIDERANDO as condições específicas de desigualdade social e espacial de nosso país, entre elas as condições habitacionais e urbanísticas, que demandam estratégias de controle que levem em consideração tais especificidades;
CONSIDERANDO as condições de moradia das populações mais pobres as quais se caracterizam, entre outras, por adensamento excessivo e coabitação, o que coloca pessoas com diferentes graus de vulnerabilidade ao vírus no mesmo reduzido espaço de habitação e a dificuldade de isolamento de idosos e outros/as pessoas vulnerabilizadas;
CONSIDERANDO a paralisação da reforma agrária, do Programa Minha Casa Minha Vida e das demarcações de áreas indígenas, quilombolas e de populações tradicionais e a existência de milhares de famílias brasileiras que moram em acampamentos e ocupações no campo e na cidade, com acesso precário ou sem acesso à água, sem condições mínimas para os cuidados pessoais para impedir a transmissão do vírus;
CONSIDERANDO as preocupações e as manifestações de falta de condições de atuação dos/as trabalhadores/as dos serviços públicos, o risco e a precariedade da proteção, a falta de equipamentos adequados para a proteção necessária e suficiente com disponibilidade pronta e contínua;
CONSIDERANDO que a Convenção nº 155 da OIT dispõe que “todo trabalhador que julgar necessário pode interromper uma situação de trabalho por considerar, por motivos razoáveis, que ela envolve um perigo iminente e grave para sua vida ou sua saúde” (art. 13) e que as empresas têm a responsabilidade e a obrigação de respeitar os direitos humanos;
CONSIDERANDO a Recomendação nº 62, de 17 de março de 2020, do Conselho Nacional de Justiça e a Recomendação nº 1, de 17 de março de 2020, do Grupo de Trabalho em Prol das Pessoas em Situação de Rua da DPU (DPGU/SGAI DPGU/GTR DPGU);
CONSIDERANDO o pedido da Alta Comissária de Direitos Humanos das Nações Unidas para que os direitos humanos estejam no centro da resposta à pandemia Covid-19;
R E C O M E N D A
· A todos os poderes, autoridades, cidadãos e cidadãs, o respeito a todos os parâmetros éticos, bioéticos e de direitos humanos nos procedimentos de atenção à saúde da população, seja aos/às afetados/as pelo Covid-19, seja aos/às que estejam em situação de altíssima vulnerabilidade ou em estágio terminal – Todas as vidas valem!
· Ao Poder Judiciário, o imediato julgamento da ADIN que pede a revogação da Emenda Constitucional nº 95/2016, de modo a viabilizar a necessária capacidade do Estado fazer frente à demanda de ação e investimento social, conforme também já pediu em manifestação o Conselho Nacional de Saúde;
· Ao Poder Judiciário, a suspensão por tempo indeterminado do cumprimento de mandados de reintegração de posse, despejos e remoções determinadas em processos judiciais, pois os processos de remoção, além de gerar deslocamentos de famílias e pessoas que foram impactadas, também as obrigam a entrar em situações de maior precariedade e exposição ao vírus, como compartilhar habitação com outras famílias e, em casos extremos, a morarem na rua;
· Ao Poder Executivo, a implantação de medidas para atendimento das necessidades dos grupos sociais que mais vierem a sofrer impacto, tomando medidas como a liberação de recursos para a retomada da reforma agrária, do Programa Minha Casa Minha Vida, a demarcações de áreas indígenas, quilombolas e de povos tradicionais, o reforço da importância dos distritos sanitários especiais indígenas, a não municipalização da saúde das populações tradicionais e a criação de um Fundo de Emergência em Defesa do Trabalho e Renda com R$ 75 bilhões do Tesouro para garantir meio salário no mínimo durante três meses a 50 milhões de trabalhadores em situação de vulnerabilidade social, entre outras, evitando medidas que autorizem redução de direitos trabalhistas, particularmente a redução de salários;
· Ao Poder Executivo, a imediata implantação de medidas necessárias para a efetivação da Renda Básica de Cidadania (Lei nº 10.835/2004);
· Ao Congresso Nacional, que não vote Propostas de Emendas Constitucionais do Plano Mais Brasil (PECs nº 186, 187 e 188) e nenhuma outra medida restritiva da capacidade de ação do Estado, visto que os mesmos enfraquecem a capacidade de resposta dos fundos nacionais e dos funcionários públicos, e que também se posicione contrário à redução ainda maior das garantias dos direitos dos/as trabalhadores/as;
· Ao Poder Executivo e as concessionárias do serviço de abastecimento, a garantia da disponibilização de água para a população que mora em ocupações e acampamentos, e melhoria nas condições possíveis de acesso à agua tratada para populações em assentamentos precários e outras situações;
· Ao Poder Executivo, que suspenda, ainda que temporariamente, a cobrança e/ou o corte de serviços essenciais como de água, gás e luz, especialmente para aqueles grupos que estão em situação de maior vulnerabilidade e que venham a sofrer drástica redução de renda;
· Ao Poder Executivo, que tome medidas para a proteção específica e especial de todos os grupos humanos em situação de maior vulnerabilidade, pessoas em situação de rua, imigrantes, idosos, mulheres, moradores de periferias urbanas, pessoas vivendo com o HIV, pessoas com deficiência, profissionais do sexo, acampados urbanos e rurais e, particularmente, todas os que são consideradas grupos de risco, inclusive assegurando o atendimento às mulheres grávidas, nos padrões estabelecidos pela OMS;
· Ao Poder Executivo e Judiciário, a tomada de providências para a proteção das populações encarceradas no sistema prisional e no sistema socioeducativo o que pode incluir, em razão da situação específica, medidas de desencarceramento daqueles/as que estejam em condições de progressão de pena ou que representem menor risco à sociedade;
· Ao Poder Executivo, a tomadas de medidas para garantir a proteção necessária e suficiente para todos/as os/as trabalhadores/as que atuam nas políticas públicas (saúde, assistência, segurança, socioeducação, penitenciária e outras), inclusive com a elaboração de escalas de serviço de trabalho decente;
· Às empresas públicas e privadas: a) a flexibilização dos horários, com a organização de escalas de horários de entrada e saída e/ou turnos alternados para os trabalhadores/as; b) interrupção de atividades de trabalho, mantendo a remuneração, com medidas de compensação e que em caso de abandono do local de trabalho em situações de risco grave e iminente não seja caracterizado como infração ou afronta ao contrato de trabalho ou mesmo ao dever da prestação dos serviços; c) não elevem o preço de alimentos e medicamentos com base na lei de “oferta e procura”, se aproveitando da pandemia para aumentar lucros nesta difícil situação, inclusive para garantir segurança alimentar;
Brasília, 19 de março de 2020.
Grupo de Referência
Rede Nacional de Conselhos de Direitos Humanos
Conselhos Signatários
(por sua Mesa Diretora, ad referendum do Pleno)
Conselho Nacional de Direitos Humanos
Conselho Estadual de Direitos Humanos do Rio Grande do Sul
Conselho Estadual de Direitos Humanos de Santa Catarina
Conselho Estadual de Direitos Humanos do Ceará
Conselho Estadual de Defesa de Direitos Humanos do Maranhão
Conselho Estadual de Defesa de Direitos Humanos do Piauí
Conselho Permanente dos Direitos Humanos do Estado do Paraná
Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana do Mato Grosso
Conselho Estadual de Direitos Humanos do Espírito Santo
Conselho Estadual de Direitos Humanos da Paraíba
Conselho Estadual de Direitos Humanos e Cidadania do Rio Grande do Norte
Conselho Estadual de Defesa de Direitos Humanos de Pernambuco
Conselho Estadual de Direitos Humanos do Tocantins
Conselho Estadual de Defesa dos Direitos Humanos de Alagoas
Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana de São Paulo
Conselho Estadual de Direitos Humanos de Rondônia
Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana do Amazonas
Conselho de Proteção de Direitos Humanos da Bahia
Conselho Estadual de Direitos da Pessoa Humana de Mato Grosso do Sul
Conselho Estadual de Defesa de Direitos Humanos do Rio de Janeiro
Conselho Estadual de Defesa dos Direitos Humanos de Minas Gerais
Conselho Distrital De Promoção E Defesa Dos Direitos Humanos (DF)
Fonte: Conselho Estadual de Direitos Humanos do RS