Mais um 1º de abril se aproxima e seguimos sem poder celebrar a memória, a verdade ou a justiça. Civis e militares interessados em manipular a história insistem em marcar o dia 31 de março como a data em que implementaram o regime ditatorial, mas nós não esquecemos que a derrubada do governo, democraticamente eleito de João Goulart, se deu no dia 1º de abril, popularmente conhecido como o dia da mentira. Felizmente hoje jornalistas não são censurados, políticos não são cassados arbitrariamente e professores não são assassinados sob acusação de subversão. Enganam-se, porém, aqueles que pensam que a violência de Estado é coisa do passado. A tortura segue sendo utilizada em larga escala em presídios, manicômios e no chamado sistema sócio-educativo para jovens pobres em cumprimento de medida. O sequestro e a ocultação de cadáveres, comandado por agentes públicos como policiais civis e militares, bombeiros e agentes penitenciários, é prática cotidiana nos bairros populares. Mas quem se importa? O Estado brasileiro, preocupado em garantir a governabilidade e mais uma reeleição, novamente se acovarda e mantém as práticas de seus antecessores. “Até quando?”, perguntam os familiares dos desaparecidos na Guerrilha do Araguaia. “Até quando?”, perguntam as Mães de Acari. “Até quando?”, perguntam camponeses, quilombolas e indígenas atingidos pela violência de Estado. Para nossa alegria, hoje, Chico Buarque pode cantar suas canções sem ser ameaçado pela censura. Dos rappers da favela, entretanto, não podemos dizer o mesmo. É essa herança que queremos deixar para as gerações futuras? A Comissão de Direitos Humanos do Conselho Regional de Psicologia do Rio Grande do Sul (CRPRS), juntamente com inúmeras entidades comprometidas com a promoção e garantia dos direitos humanos, permanece vigilante para que a tortura, a censura, o sequestro e o assassinato protagonizados por agentes públicos, assim como os regimes ditatoriais, sejam coisa do passado. O esquecimento pregado por aqueles que não querem que a história seja contada é o aval para que a violência de Estado persista nos dias de hoje. O Estado tem o dever de cumprir a Lei 9.140/95, que prevê o esclarecimento dos fatos intimando todos os agentes públicos envolvidos a prestarem esclarecimento. Agora é a hora de o Brasil tomar como exemplo nossos vizinhos latino-americanos e resgatar seu passado para que essas violações não voltem a marcar a nossa história.
Luciana Knijnik Psicóloga, presidente da Comissão de Direitos Humanos do Conselho Regional de Psicologia do Rio Grande do Sul