Um rico processo de reflexão e debate por parte da categoria marcou o Fórum Estadual do Ano da Psicoterapia, realizado das 9h às 18h do sábado, 22/08, no auditório do Coral Tower Hotel. O espaço ficou lotado por participantes de Porto Alegre e pelas delegações do CRPRS vindas de Caxias do Sul, Pelotas e Santa Maria, especialmente para o encontro. “A Constituição das Psicoterapias como campo interdisciplinar”, primeiro eixo do evento, foi abordado pela mesa composta pela professora e psicoterapeuta cognitiva Simone da Silva Machado e pela psicóloga e psicanalista Denise Costa Hausen, com mediação da psicóloga psicanalista Clarice Moreira da Silva, conselheira do CRPRS e coordenadora do GT da Psicoterapia.
“Se a psicoterapia é uma disciplina científica ou um conjunto de métodos e técnicas, uma coisa não exclui a outra”, afirmou Denise. Ela alertou para o risco do corporativismo nesta discussão. Na mesma linha, defendeu: “Não podemos eliminar qualquer teoria e prática regulamentada no corpo da nossa profissão”.
Simone, por sua vez, ilustrou sua explanação com a exibição de imagens de obras de arte e disse que é “extremamente complicado falar em hierarquia entre as psicoterapias”. E chamou a atenção para o risco de um conhecimento muito específico: “Especializar-se não significa ter um conhecimento focado, específico. Especializar-se é sim, ir além, acrescentar novos olhares a uma ação.Caso contrário podemos ficar presos em “igrejas teóricas”, voltados a espaços exclusivistas”, argumentou.
Parâmetros técnicos e éticos
Após os debates do tema, com intensa participação da platéia, o painel seguinte abordou “Parâmetros técnicos e éticos mínimos para a formação na graduação e na formação especializada e para o exercício da psicoterapia pelos psicólogos”. Na mesa, o psicólogo e psicoterapeuta Jefferson Silva Krug, coordenador do Curso de Psicologia da FACCAT; a psicóloga, terapeuta psicodramatista e coordenadora da ABEP Sul, Algaides de Marco Rodrigues; com mediação de Sandra Rute Silva Martins, psicóloga, psicoterapeuta e conselheira do CRPRS. Abordando o crescimento e o desenvolvimento das áreas de atuação do psicólogo nos últimos anos e suas repercussões na formação do psicólogo, Jefferson questionou: “A diversidade de práticas que atualmente temos em psicologia enfraquece o estudo da psicoterapia na graduação? Ou coloca a questão de que devemos refletir sobre a abrangência da prática de psicoterapia e quais seus campos de exercício?”.
Sobre os parâmetros técnicos e éticos, Algaides lembrou que a “a graduação deveria em tese dar toda a formação necessária – mas nunca estamos prontos. É importante não só a prática no consultório privado, mas também em outros espaços, com diferentes pacientes e outros tipos de sofrimento”. Para ela, “é preciso também ter troca de saberes e internacionalizar em nós estas vivências”. Da platéia, partiu a colocação: “Não se pode ter uma idéia linear de aprendizagem da psicoterapia, pois o aprendizado é complexo e vivencial”. Outra presente, favorável à criação de parâmetros, defendeu que “a autorização para a prática da psicoterapia deve vir dos próprios pares, que legitimam aquele profissional.”
Outras abordagens
O pioneiro Chico Pedro, 82 anos, um dos fundadores do CRPRS, disse que é fundamental na formação haver transdisciplinaridade entre os docentes. E recordou que há outras abordagens, a serem conhecidas e debatidas: “Na Universidade da Costa Rica, por exemplo, os últimos dois anos são de estágio em projetos comunitários, com diagnóstico e avaliação e uso de práticas diversas”. Também citou o caso do Canadá. “Lá o professor é também um consultor do aluno, e o estudante sempre faz uma auto-avaliação. Em outros países só se recebe o título de psicoterapeuta após o segundo ano de pós-graduação”, afirmou. Chico Pedro deixou uma reflexão para todos: “A história não é feita de soluções, e sim de processos...”
Demais grupos
“Relações com os demais grupos profissionais que têm reivindicação do exercício da psicoterapia” foi a terceira e última mesa do Fórum. O debate ficou a cargo da psicóloga e psicanalista Bárbara de Souza Conte, ex-conselheira do CRPRS e membro pleno da Sigmund Freud Associação Psicanalítica; e da psiquiatra e psicanalista Amélia Thereza de Moura Vasconcellos, membro e fundadora da ABRAP. Como mediadora, a psicóloga especialista em psicossomática Eduarda Coelho Torres, conselheira do CRPRS.
Única médica participante do Fórum, Amélia referiu que “é preciso delimitar áreas, mas trabalhar com humildade e ter vasos comunicantes”. Ela garantiu ter aprendido muito com psicólogos, assistentes sociais e pedagogos. Porém, além da formação básica e específica da metodologia e da prática psicoterapêutica, a representante da ABRAP diz que “o futuro profissional precisa se submeter à psicoterapia pessoal, como paciente, pois irá trabalhar com as emoções das pessoas e necessita ter claro até onde suas próprias emoções podem interferir no processo”. Amélia também afirmou que a regulamentação da área da psicoterapia não é suficiente para resolver a questão e garantiu que a ABRAP “não pensa em regulamentar esta prática”.
Bárbara Conte, igualmente, entende que a diversidade que caracteriza a psicologia e o campo das psicoterapias deve ser discutida “além de enquadramentos e regulamentações”. Conforme ela, as associações que congregam psicólogos e psicoterapeutas “precisam, democraticamente, criar espaços para o diálogo, não só entre os psicólogos, mas entre os psicólogos e as demais categorias que exercitam a psicoterapia, para discutirem parâmetros que garantam a competência nessas práticas”.