A Comissão de Direitos Humanos e o Centro de Referência Técnica em Psicologia e Políticas Públicas (CREPOP) do CRPRS promoveram na terça-feira, 06/07, a reunião ampliada “Saberes indígenas por outras psicologias”, mediada pelas conselheiras Cristina Schwarz e Carla Tomasi.
A atividade contou com a participação da psicóloga Rejane Paféj Kanhgág (CRP 07/33225), da Terra Indígena Sede Nonoai, mestranda em Psicologia Social e Institucional na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) que falou sobre a importância da decolonização da Psicologia, que precisa considerar as diferentes formas de existência, de ser e de viver, e ressaltou os desafios dos povos indígenas na luta por sobrevivência e direitos, sobretudo na conjuntura atual.
Ao contrário da Psicologia ensinada nas universidades, para os povos indígenas ouvir vozes, por exemplo, pode ser sinônimo de saúde, pois representa uma conexão com guias espirituais. “O que é saúde mental para o povo indígena? Precisamos respeitar o lugar do outro, não impor o que para nós faz sentido. Temos que pensar em saúde mental como um momento terapêutico dentro da aldeia e mostrar como a visão colonial nos adoece”, afirmou Rejane. Para a convidada, o capitalismo e a consequente imposição social de sempre ter que produzir e ter mais chega como uma doença. “Quanto mais trabalhamos para o capitalismo, para produzir, mais adoecemos”.
Sobre a formação da/o psicóloga, Rejane ressaltou como a academia é centrada em um modelo ocidental-europeu e lembrou das dificuldades que tinha de se “enxergar” nessa Psicologia quando ingressou na universidade. “Que tipo de Psicologia eu vou trabalhar dentro da aldeia? Não posso desconsiderar o momento terapêutico que temos dentro da aldeia. Para nosso povo, a medicina tradicional é saúde e a Psicologia precisa trabalhar em conjunto com todos os modos de ser, viver, pensar e agir indígenas. Para estar firme espiritualmente, precisamos da mente e corpo sadios, está tudo conectado: corpo, mente e território. Se tudo ao nosso redor estiver sadio, vamos estar sadios. Se tudo ao redor estiver adoecido, vamos adoecer também”. A força do coletivo também foi destacada por Rejane como algo muito importante para a saúde mental.
Outro aspecto que precisa ser considerado é a diversidade entre os povos. O programa do SUS voltado a população indígena, por exemplo, desconsidera as mais de 300 etnias e suas particularidades e especificidades culturais.
Para a conselheira Cristina Schwarz a reunião mostrou a necessidade de o CRPRS promover mais espaços como esse, para dar voz a conhecimentos como os de Rejane. “Precisamos dar mais espaço para que os povos indígenas possam falar de si, desacomodando e descontruindo essa Psicologia tão normatizadora que temos”, concluiu.
Essa discussão já está em curso na Consulta Pública do CREPOP para a construção das Referências Técnicas para a atuação de psicólogas/os junto aos povos indígenas. Saiba mais clicando aqui.
Luta e resistência
No segundo momento da reunião, Rejane falou das dificuldades atuais vivenciadas pelos povos indígenas com a pandemia da Covid-19 e as ameaças com a tramitação do Projeto de Lei 490/2007, que recentemente ganhou força para ser votado.
O PL 490/2007 altera a legislação existente quanto ao regime jurídico constitucional e infraconstitucional de demarcação de terras indígenas. Ele prevê alterações no Estatuto do Índio (Lei 6.001/1973), transferindo da União para o Congresso a competência para demarcar terras indígenas e inserindo no Estatuto a tese do Marco Temporal, que reconhece o direito à terra somente de povos que ocupavam o território até a promulgação da Constituição de 1988. A tese aguarda decisão final do Supremo Tribunal Federal (STF).
“Essa é uma investida de morte sobre a história de nossa terra. Estamos diante de um grande retrocesso. Tudo o que temos foi lutado, muito sangue derramado, muitas vidas perdidas. Para nós, o território não é produção/consumo, é algo sagrado. Essa luta deveria ser de todos, pois territórios e saberes estão sendo ameaçados. Nós resistimos para existir”, concluiu Rejane.
Clique aqui e confira nota publicada pelo CRPRS em defesa das terras indígenas e contra o PL 490 e o Marco Temporal.
Vem aí o 11º CNP
A reunião ampliada “Saberes indígenas por outras psicologias” já foi considerada um evento preparatório para as etapas que antecedem o 11º Congresso Nacional da Psicologia (CNP), instância máxima em que são discutidas e deliberadas políticas prioritárias para os próximos anos, ou seja, para as próximas gestões dos Conselhos Regionais e do Federal.
O 11º CNP será realizado pelo Conselho Federal de Psicologia de 2 a 5 de junho de 2022 e terá como tema “O Impacto Psicossocial da Pandemia: Desafios e Compromissos para a Psicologia Brasileira Frente às Desigualdades Sociais”. Para participar é preciso ter sido eleita/o delegada/o nos Congressos Regionais da Psicologia (Coreps), que serão realizados entre 18 de março e 17 de abril de 2022. Os Coreps reúnem as/os representantes que foram eleitas/os nos Pré-Congressos, que acontecem entre 30 de setembro de 2021 a 28 de janeiro de 2022.
Fiquem atentas/os à agenda dos Pré-Congressos que serão promovidos pelo CRPRS e participem!
Devido a uma falha técnica na gravação, o vídeo disponibilizado aqui não mostra as intérpretes de LIBRAS que acompanharam a reunião. Isso será corrigido e, assim que possível, iremos disponibilizar um novo vídeo.