Webinário alusivo aos 16 dias de ativismo pelo fim da violência contra as mulheres, a atividade “Direitos sexuais e reprodutivos: o que a Psicologia tem a dizer?” foi realizada na quinta-feira, 10/12, marcando o Dia Internacional dos Direitos Humanos. A organização do evento foi da Comissão de Direitos Humanos, da Subsede Serra e do Núcleo de Gênero, Raça e Sexualidade da Subsede Sul do CRPRS.
No debate, temas como violência obstétrica e aborto legal, na sua interface com a violência sexual. Para a conselheira Cristina Schwarz (CRP 07/17014), presidenta da Comissão de Direitos Humanos do CRPRS, pautas relacionadas a discussões de gênero – que se interseccionam com temas como raça, sexualidades e deficiências, por exemplo – precisam estar presente no cotidiano das/os psicólogas e transversalizar práticas, em diferentes âmbitos de atuação. “Questões de gênero têm uma transversalidade com todas as formas de violência que se configuram em nossa sociedade. Temos o desafio, enquanto psicólogas e mulheres, a enfrentar esses problemas e a contribuir na construção de uma sociedade mais igual, mais justa e que supere diversas formas de violência cotidiana”.
Lara Werner, graduanda em Saúde Coletiva pela UFRGS, coordenadora do Observatório da Violência Obstétrica no Brasil e integrante do projeto Clínica Feminista da UFRGS, participou do evento como debatedora. Em sua fala inicial, apresentou uma contextualização histórica sobre marcos legais dos direitos humanos aplicados ao exercício da sexualidade e reprodução humana. “A Psicologia tem muito a contribuir nessa discussão e, para isso, precisa refletir sobre os jogos de poder que envolvem essas questões, defender direitos essenciais e denunciar violações de direito”. Lara citou a necessidade de descriminalizar o aborto socialmente e de o Estado assumir seu papel.
Jocélia da Cruz de Almeida (CRP 07/28766), coordenadora do Núcleo de Políticas Públicas da Subsede Serra do CRPRS e representante do CRPRS no Conselho Municipal de Saúde de Caxias do Sul, trouxe sua experiência atuando em centros obstétricos como técnica de enfermagem. Ela destacou que a violência obstétrica pode se configurar de diferentes formas. “São agressões sofridas pelas mulheres no pré-natal, no parto, pós-parto ou em um aborto. Geralmente está vinculada a figura do médico, mas pode ser produzida por diferentes atores, para além dos profissionais que atuam nos Serviços de Saúde”. Para Jocélia os serviços de saúde nem sempre estão preparados para oferecer um atendimento humanizado a todas as mulheres.
Thaíse Mendes Farias (CRP 07/28216), mestre em Ciência Política pela UFPel, especialista em Direito do Estado e em Psicologia e Sexualidade, coordenadora do Núcleo de Processos Clínicos e Psicossociais da Subsede Sul do CRPRS, também ressaltou a importância de se conceituar a violência obstétrica, que pode ser física, psicológica, patrimonial e econômica. “Tudo o que faça a gestação e o ato de parir humilhante, desnecessariamente dolorido ou sofrido, antes e depois do parto, pode ser considerado violência obstétrica. É um tema multifatorial e complexo”. Thaíse trouxe diferentes exemplos de violência obstétrica, muitos ligados a estereótipos racistas. “A falta de analgesia para mulheres negras, por exemplo, é feita considerando o mito de que mulher negra é forte e suporta mais a dor”. A ausência da discussão do tema nos espaços de formação das/os psicólogas/os foi apontado por Thaise como um problema. “Falta embasamento teórico para ter uma boa escuta e acolher esse sofrimento. A/O profissional da Psicologia não está preparado para detectar uma violência obstétrica e poder ajudar”.
O tema do aborto legal foi apresentado por Ângela Ester Ruschel (CRP 07/08698), mestre em saúde coletiva e especialista em Psicologia Clínica pela UFRGS e em Violência pela USP, servidora do Hospital Materno-Infantil Presidente Vargas e Membro do Fórum Aborto Legal do RS. Ângela citou a falta de discussão pela sociedade sobre esse tema, que ainda é tido como um tabu. Para ela, isso está atrelado à criminalização do aborto. “Países que têm as leis mais restritivas com relação ao aborto são os que têm mais casos, que acabam sendo praticados na clandestinidade, que o torna inseguro e pode causar outros problemas de saúde e sequelas”.
Ângela lembra que a construção de políticas públicas no país nesse campo se deu pela organização dos movimentos de mulheres que conseguiram importantes conquistas nos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres. Agora, o Brasil, que tem uma das leis mais restritivas do mundo, vive um momento crítico com retrocessos no procedimento que permite o aborto legal. A recente publicação pelo Ministério da Saúde de portarias que representam retrocessos ao direito do aborto legal no país também foi destacada por Ângela: “A insegurança que provoca nos serviços de saúde é intencional, tem objetivo desorganizar serviços que já são frágeis e são poucos”. Além disso, o fato de a sociedade e das/os profissionais da saúde não conhecerem esses direitos gera ainda mais obstáculos. “Precisamos ter informação básica, saber orientar e encaminhar nos casos em que tem esse direito. Muitas mulheres não conseguem buscar ajuda, decidem silenciar essa violência que sofrem. A sociedade machista, responsabiliza a própria mulher pela violência que sofreu”.